terça-feira, 31 de janeiro de 2017

when you lose something you cannot replace

Assaltas-me a memória a toda a hora - volta e meia, distraio-me e lá estás tu outra vez. Vejo-te sentado ao meu lado, no parque, com o passarito de peito laranja, inchado de orgulho, a saltitar à nossa volta. Ouço a tua voz, num sussurro, a pedir que nunca te deixe - e as memórias têm esse efeito ambíguo de num momento me deixarem com um sorriso nos lábios para, no momento a seguir, tentarem enxotar a dor com lágrimas que nunca são suficientes.

As horas passam lentas por mim, como que para me torturar por ter tomado uma decisão que contraria por completo a vontade do coração. Eu gosto de ti, quer queira quer não. Gosto de ti com toda a intensidade que consigo imprimir no verbo, porque não sei ser de outra forma senão assim: intensa. No bom e no mau, intensa.

Gostava que tivesse sido diferente; pensar no teu jeitinho meticuloso de ser dá-me vontade de chorar, como se tivesse acabado de perder uma peça única que não tenho como recuperar, porque é assim que te vejo: único. E talvez um dia isto não me faça sentido mas hoje sinto-me como se me tivessem rasgado um pedaço e fosse imperativo que eu aprendesse a viver como se estivesse completa. Não estou. Faltas-me tu.

Conhecer alguém traz sempre este risco escrito em letras minúsculas no final da folha: corres o risco de te viciar no sabor recém adicionado à tua vida, corres o risco de a desaprender tal qual era até ao dia em que alguém chegou - eu sou dessas. Não das que marcam, mas das que se deixam marcar. Das que vivem bem até descobrirem que podem viver melhor, e que nunca, por nunca ser, querem dizer adeus a alguém que tem a capacidade de lhes acelerar o coração.

Se pudesse mudar alguma coisa, mudava-nos o fim. Reescrevia a história de duas pessoas esquisitas que um dia se abraçaram à beira mar - extendía-lhes a trama e nunca mais as deixava largarem-se.

Quem me dera. 
Quem me dera ter-te ao meu lado.

pensando melhor

De regresso a casa, vi-me ao espelho e concluí que nem para cortadora de fiambre me contratariam por terem receio de que aproveitasse para me auto-fatiar em jeito de suicídio lento e doloroso: vesti, literalmente, a primeira roupa que me apareceu no armário e que, só por acaso, nem enquanto varredora de ruas me favorece - sinto-me ainda mais gorda do que o costume. Os olhos denunciam uma noite em que já passava das cinco da manhã quando consegui adormecer, e o inchaço não deixa negar que houve demasiadas lágrimas à mistura - para complementar, o ar adoentado e pálido de alguém que já conseguiu sair da cama mas continua com demasiadas dores de cabeça para conseguir fingir que está bem. Não houve pachorra para maquilhagem, e nem as unhas escapam à imagem degradante - o verniz, com uma semana, completamente lascado.

Eu costumo sair de casa mais bem vestida, mais bem arranjada - mas há dias em que simplesmente não me apetece. No entanto, ao pensar no olhar das gajas, todas bonitinhas, todas magras, todas bem vestidas, acho que é a primeira vez que a minha simplicidade me envergonha.

Caramba. Há algum lugar onde eu faça sentido?

there you go, self esteem

Entreguei o CV numa loja onde, em boa verdade, nunca comprei nada porque só tenho dinheiro para comprar um saco de plástico da marca - arrependi-me no exato momento em que entrei no antro das bonecas.

Mal me aproximei do balcão, de folhas em punho e a confiança, algures, no fundo de um baú perdido no sótão, dei por mim rodeada por quatro barbies que me perscrutavam com o olhar interrogativo de quem não percebe o que é que um saco de batatas como eu espera poder fazer ali.

Saí de lá com um nó no estômago - imagino que tenham rasgado o currículo mal virei costas, ou que se tenham rido de mim. Aquilo é para meninas bonitas; eu, no máximo, tenho perfil para ser varredora de ruas ou cortadora de fiambre.

sobre outro dia em que não consegui escrever, sobre outra noite em que não consegui dormir

Gostava de poder acreditar que um dia vais sentir a minha falta, mas não vais - há demasiadas coisas erradas em mim para que eu consiga ser mais do que um fardo. Desculpa por isso.

Sem ti, os dias perderam o pouco sabor que ainda tinham; é a merda do costume, mas agora sem ânimo possível, sem esperança de melhorar. Sem aquela promessa de dias melhores; passava o meu tempo a contar os dias para te voltar a ver. Se nunca o disse foi porque nem me apercebia disso: estava consciente de que havia algo a travar-me os sentimentos, e demorei a dar-me conta de que tinhas sido capaz de mudar isso.

Sinto-me realmente estúpida por ter acreditado que era recíproco - eu devia saber que não sou boa o suficiente. Sou sempre a amiga, só a amiga. Nunca sirvo para mais do que isso - mas a frustração é tanta que ainda não passou uma noite em que não me deixasse a chorar outra vez. Nada ameniza esta sensação de vazio, nada ampara a queda de uma nova ilusão. E, caramba, dói tanto.

Imagino que por esta altura já nem queiras saber - imagino que seja demasiado fácil substituir-me por alguém que valha a pena e de quem seja possível gostar. Essa ideia consome-me ainda mais mas agarro-me a ela de todas as vezes que sinto vontade de falar contigo: não vale a pena. Tal como eu.

segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

this meant something to me, there's a hole in my heart where you used to be

[fecho os olhos e caminhamos outra vez, lado a lado, à beira mar. está frio e entra mais areia nas minhas botas a cada passo dado, mas eu não me importo porque estás comigo.
no céu, pintado de um cinzento carregado como promessa de chuva, desenha-se um arco-íris a enfeitar aquela que será sempre a minha cidade; na tua companhia, parece-me ainda mais bonita. pensas tirar uma foto mas atrapalhas-te todo com o telemóvel; desistes. vou guardar esta imagem na memória, anuncias. espero que ainda a tenhas.
pelo canto do olho, observo cada um dos teus movimentos: sinto-me pequenina ao pé de ti e isso nada tem a ver com o facto de seres estupidamente mais alto. a forma desajeitada como caminhas sobre a areia faz-me sorrir - a tua confiança condimentada com uma dose de timidez torna-te absolutamente irresistível. soube-o nesse dia.
quando o céu cumpre com o prometido e as comportas se abrem, corremos para nos abrigar, sem abrigo possível. acabamos os dois, sentados, num banco de madeira com o vento a fustigar-nos nas costas: vês-me a tremer e aproveitas para me abraçar. é a primeira vez que o fazes e sabe-me tão bem que eu tolero o frio, a enregelar cada átomo do meu corpo, só para ficar mais um bocadinho no teu abraço quente. não te quero largar mais.
depois disso, sinto os teus lábios gelados pousados na minha testa. demoramos um tempo absurdo a percorrer o caminho de volta porque páras para me abraçar e para distribuir mais beijinhos entre a minha testa e as bochechas. sinto-me importante, depois de tanto tempo - e, com a cidade desenhada no horizonte a servir de plano de fundo, parece-me que nada poderia correr mal. és demasiado especial para que eu te deixe ir.
abro os olhos - é isto que acontece no fim: penso no início. penso em todas as sensações boas, que agora me vejo obrigada a arquivar, porque a minha tendência é destruir sempre tudo. penso em quanto eu gostava que me fosse possível voltar a moldar esta história e torná-la viável. dar-lhe um final feliz. mas um dia acordei e percebi que gostava demais, outra vez: pudesse eu recomeçar. pudesse eu voltar a este dia e fazer-nos possíveis.
pudesse eu, por uma vez, ser a escolhida da felicidade que parece estar sempre a esquecer-se de mim.]

domingo, 29 de janeiro de 2017

kit para os dias tristes

Yann Tiersen e rainy mood, em simultâneo.
Desafio-vos a não se suicidarem.

sou boa nisto.

Apanhaste-me desprevenida: aconteceste numa altura da minha vida em que eu tinha prometido a mim mesma que não deixaria acontecer, mas não tive como evitá-lo. Aproximaste-te de mansinho, despretensiosamente, e soubeste manejar o meu coração com as pontinhas dos dedos, tal qual deve ser manejado; tinhas as palavras certas, os sorrisos certos, os abraços certos. Tudo em ti batia tão certo que eu devia ter percebido que nunca poderia durar muito. Correndo o risco de me fazer feliz, nunca poderias ter ficado na minha vida - vinte e um anos de histórias falhadas já me deviam ter feito aprender isto.

Eu já tinha as palavras na ponta da língua - não as ensaiei nem fantasiei sobre discursos bonitos, mas sabia que as queria dizer. Acordei com a resposta à pergunta que fiz a mim mesma vezes e vezes sem conta; em tempos, nem julguei que me fosse possível por me sentir presa num emaranhado de pontas soltas de um passado que ainda mal sabe que o é. Mas foi: conseguiste-o. Conseguiste puxar-me para cá e conquistar-me num tempo presente, isento das amarras de um ontem mais longínquo do que a minha memória deixa parecer.

Tinha as palavras na ponta da língua, mas arrumei-as outra vez - há uma certa dose de humilhação a correr-me nas veias, uma oferta de mim para mim, por ter acreditado que, por uma vez, o que sinto poderia ser recíproco. A culpa não é tua, mas eu sou tão cheia de sentimentos que, no que toca ao gostar, exagero no verbo e chego a ser desleal para comigo mesma - achei-te capaz da mesma atrocidade, imagina só. Por momentos, senti as tuas mãos nas minhas costas e os teus beijos, cada vez mais intensos, como sinal de que estávamos a saltar juntos para um capítulo novo. Erro meu, desculpa-me por isso.

Não penses que me dói menos por ser a que vira as costas e bate com a porta - perder-te dói-me mais do que possas imaginar, mas não posso ficar aqui. Não posso continuar a permitir-me esta ansiedade boa de voltar a correr para ti se não vou ter direito a um buraco na tua agenda. Não posso continuar a criar a ilusão de que significo algo mais do que aquilo que algum dia poderia significar - e é por isso que nos despedimos aqui.

Certa estou de que não sentirás a minha falta. Os meus braços são facilmente substituíveis por outro par onde não reste espaço para desculpas nem para demoras, e as minhas palavras perderão o significado com o tempo também - mas eu vou sentir a tua como quem perde uma das poucas coisas que lhe dava ânimo.

Encerro o capítulo e fecho o livro que conta a história de um caso acidental - hoje bato com a porta com a certeza de que me encerro do lado errado.
Era contigo que eu queria ficar, mas não posso.

não adianta mentir

Eu tento armar-me em má mas sou das que choram - e choro muito mesmo! Choro baba e ranho. Choro a noite toda, se for preciso - choro pelos problemas de hoje, da semana passada, de há três anos e do carnaval de 1992, mesmo antes de eu nascer. Choro até me engasgar com a saliva e perder toda a pouca dignidade que me acompanha nestas noites, até adormecer.

E, no dia seguinte, acordo com os olhos inchados a fazer-me parecer descendente de um casal de chineses gorduchos, e recomeço a choradeira para me lembrar do que é bom.

São estes os meus planos para esta noite.
E para amanhã também.

sábado, 28 de janeiro de 2017

[like a bridge over troubled water]

O dia de amanhã não importa assim tanto,
Foi a vida ou o universo ou qualquer outra entidade a girar a roleta que nos fez calharmo-nos em sorte um ao outro. Não sei quem ditou este cruzamento nas nossas vidas e que, daí em diante, caminharíamos lado a lado, na mesma estrada, mas gostava de lhe agradecer.

Há dias em que me apetece adiantar os relógios, rasgar mais folhas no calendário. Acelerar o tempo para combater a tua calma, para estar há mais tempo na tua vida: não me podes culpar, mas há dias em que o desejo é mais voraz e fala mais alto do que a minha admiração pela tua serenidade; gosto da paz que me transmites mas também gosto da vida em roda viva, da pressa, da sofreguidão de ser.

Outros há em que é precisamente na tua calma que me quero perder. Na forma leve e lenta como levas as coisas, no jeito perfecionista com que colocas um pé à frente do outro sem descuidos, sem dar um passo maior. Um salto. É fácil falar com alguém como tu porque sei que, o que quer que digas, será verdadeiro: desculpa-me pelos dias em que me esqueço disto. Às vezes tremem-me as pernas e volto a cair de joelhos por dores antigas que eu vejo desenrolarem-se diante dos meus olhos uma e outra vez; a culpa não é tua. Dá-me a mão enquanto fores capaz, ajuda-me a levantar e eu não irei a lado nenhum sem ti.

Não és perfeito e temos tanto de iguais quanto de opostos: juntos formamos uma melodia imperfeita, talvez a mais imperfeita de todas, mas é bonita porque nunca teve pretensões de ser qualquer outra coisa que não o que era: a melodia que junta duas almas que se encontraram num dos inúmeros acasos da vida e que nunca sabem ondem vão chegar. Talvez nunca cheguemos a parte alguma mas, por agora, gosto de a ouvir tocar porque me lembra de que te tenho na minha vida e da sorte que tive nesse jogo de improbabilidades que trouxe até mim alguém como tu.

Guardo-te as palavras bonitas como uma mãe guarda o último pedaço de bolo para o filho: quero que estejas certo da tua posição na minha vida, do carinho que te tenho e do quanto te desejo o melhor. Guardo-as para ti porque, neste momento, o que sinto de melhor te pertence, a ti, a pessoa mais diferente e especial que conheci até hoje. Guardo-as porque são a maior retribuição que tenho para o que me fazes sentir.

Entorpeces-me os sentidos: o teu sorriso faz-me sempre pedir por mais, a forma como me abraças para espantar os medos torna qualquer tentativa de fuga impossível porque me rendo a ti e os teus beijos foram a primeira coisa a acelerar-me o coração em muito tempo. E a facilidade que temos em falar sobre tudo - menos sobre o sporting porque eu não ligo a futebol mas não resisto a ferir-te os sentimentos - reforça a ilusão de que já nos conhecíamos mesmo antes de nos conhecermos. 

Acredito que o para sempre exista com a data limite que lhe queiramos impor. A minha é enquanto der; quero-te comigo para sempre, enquanto a convivência nos for possível, enquanto fizer sentido, enquanto houver espaço no teu coração para me albergar. Gosto de ti. Tanto, mas tanto.

Bem vistas as coisas, o dia de amanhã não importa assim tanto - desde que te tenha ao meu lado, estará tudo bem.

sexta-feira, 27 de janeiro de 2017

aguardando por dias melhores

Ao terceiro dia de clausura, saí da cama para o sofá. Vi a luz do sol porque abri as lâminas das portadas e fiquei a tentar manter-me acordada mas as pequenas sestas são inevitáveis e, quando tento desfilar o fat ass pela casa, sinto-me tonta de tanto sono - ontem quase tive um ataque cardíaco porque, atordoada como estou, por momentos achei que tinha tomado quatro comprimidos em vez de dois, e já me via a falecer com uma overdose de ilvico. Bem vistas as coisas, tendo em conta o efeito sonífero da coisa, no máximo acordava lá para segunda feira.

pequeno tutorial sobre o que não publicar no facebook se quiserem provar quem têm um QI acima dos 20

A única altura das vossas vidas em que as indiretas são engraçadas e mais ou menos aceitáveis é quando vocês têm 11 anos e estão a usar o hi5 pela primeira vez. Depois disso são só ridículas.

Nunca entendi a piada de terem o mural do fb cheio de imagens brasileiras manhosas e descrições escritas pelos donos do fb em questão, descrições começadas, preferencialmente, por há pessoas que...

Há pessoas que deviam ter vergonha na cara; 
Há pessoas que deviam trabalhar mais; 
Há pessoas mesmo burras.

E há, que as há - mas a verdade é que este tipo de discussões, mais ainda quando não passam de monólogos facebookianos, fazem todo o sentido... mas, entretanto, a pessoa passa para o nono ano e começa a parecer um bocado mal tanta pequenez de espírito.

O que me assusta é isto partir de gente adulta - gente que, com idade para ter juízo, continua a preferir este meio para atingir  terceiros: se precisam de dizer alguma coisa a alguém, façam jus à idade que têm e digam diretamente - expliquem o problema, digam o que vos desagrada, repitam-no três mil e oitocentas vezes, se for preciso, até que haja um consenso. Ou, mesmo que não haja, safoda - mas não finjam que está tudo bem se depois vão encher as redes sociais com indiretas ridículas e infantis. Isso não vos torna fortes, não vos torna fixes - acaba com toda a credibilidade que poderiam ter, arruma-vos toda a razão numa gaveta funda e, se as pessoas forem como eu, ficam à beira de ver uma amizade encerrada com um bloqueio. 

Não há pachorra para revolucionários de sofá e muito menos para gente que, sentindo-se no direito de opinar sobre a vida alheia, gasta o seu tempo a escrever indiretas achando que engrandece dessa forma. Pelo contrário... tornam-se cada vez mais insignificantes. Cada vez mais desprezíveis.

a vida e a morte em círculos

Mais do que uma vez, as pessoas olharam-me como se fosse louca quando lhes falei, com deleite, das minhas peripécias no hospital. Diziam-me que não seriam capazes, que não se imaginavam em tal sítio, cheio de desgraças e de doenças e de lágrimas. Eu via outra coisa: via recuperação, superação. Via amor impresso em olhares cheios de preocupação, em dedos enlaçados com a força de quem não quer ver alguém partir. Vi a morte, sim, algumas vezes. Vi coisas mais ou menos feias - e adorei cada uma delas porque lhes sentia a efemeridade. Sabia que, se tudo corresse bem, seria algo transitório e um dia não seria mais do que uma má recordação.

Por outro lado, sempre disse que não me imaginava a trabalhar num lar. Disse, aliás, que se não pudesse trabalhar no hospital, preferia uma caixa de supermercado a um lar. E, ainda assim, tentei; quis saber se não passaria de um capricho, se não seria ainda melhor. A minha aventura durou três dias e serviu para perceber que tinha razão desde o primeiro instante.

Os lares conseguem ser mais mórbidos do que os hospitais. A vida acontece em círculos pontuados por uma morte ou outra que, no fundo, significam apenas inquilinos novos: aquelas pessoas passam os dias ali, à espera do último dia. As rotinas repetem-se, dia após dia, sem que nada de novo aconteça; o lar transforma-se na segunda casa de cada uma das funcionárias, e os idosos passam a ser como os filhos. É preciso cuidá-los, levá-los à casa de banho, limpar a casa, garantir que estão bem. E, na maior parte do tempo, não acontece absolutamente nada: o tempo esquece-se de passar dentro daquelas paredes, certamente numa última tentativa de enganar a morte. E o azar de um será sempre a sorte de outro: uma cama nunca demora muito a ser preenchida. Há sempre alguém à espera de uma baixa.

Não há esperança de recuperação. O lar é a espera fatal: no dia seguinte, se não estiverem iguais ao anterior é porque estão piores ainda. A ideia não é deixá-los melhor para poderem ir ter com a família porque, na realidade, a família depositou-os* ali, às mãos de terceiros, para que deixem de ser um problema seu até que morram. Entristece-me, revolta-me - é uma realidade mais dolorosa do que qualquer hospital. É uma espera mais injusta, mais triste, mais solitária, mais desamparada - tenho todo o respeito por quem consegue suportar o trabalho de um lar porque, se é preciso coragem para trabalhar num hospital, é precisa muita mais coragem para aguentar assistir de camarote ao perecimento dos corpos que um dia foram tão cheios de vida e de sonhos quanto os nossos.

*quero deixar claro que não vejo os lares como um depósito e que acho que é o melhor que qualquer família, que não possa tomar conta de um idoso, tem a fazer - refiro-me a casos que conheço de perto, de pessoas que foram deixadas no lar e não recebem qualquer visita.

o outro lado do mundo é ali ao virar da esquina

Assim que olhei para ele, tive a sensação de já o ter visto antes - com uma marca algo peculiar na cara, seria mais ou menos improvável que o estivesse a confundir com alguém. A sensação perdurou durante toda a entrevista, bem como no dia seguinte em que, já doente e sem pachorra, aceitei passar o dia com eles para perceber o que é que eles faziam.

Por achar que algo não batia certo e, essencialmente, por não ser capaz de me imaginar a ganhar dinheiro fácil iludindo as pessoas, não aceitei o emprego e nunca mais pensei nessa sensação de déjà vu quando meti os olhos em cima do meu ex-futuro-patrãozinho.

Até hoje.
Tendo experimentado o tinder há uns meses, hoje lembrei-me de o reinstalar - está com uma bug qualquer e não funciona, então estive só a ver a minha lista das matches em jeito de festinhas no ego porque, vá, quer a intenção fosse só fazer-me um assalto à cueca, quer já me imaginassem a ir ao encontro deles ao altar, vestidinha de branco, não me posso queixar.

E foi assim que eu me apercebi que quase acabei a trabalhar para uma das minhas matches do tinder - nunca conversámos mas está lá, em jeito de prova. Largos meses antes de eu sonhar sequer que algum dia ele me iria fazer uma entrevista para um emprego... parece que gostámos um do outro numa app manhosa.

(btw, pessoalmente é mais baixo do que eu, tem namorada e subiu na vida de forma que, de tanto me parecer duvidosa, me fez rejeitar um emprego. não, não era um bom moço para mim.)

quinta-feira, 26 de janeiro de 2017

#foreveralone

Estranhei quando recebi a primeira mensagem a dizer olá - não somos propriamente amigos nem costumamos conversar por mensagens. Achei que ele precisava de alguma coisa, e respondi-lhe, questionando-o sobre o que se passava.

13h22 - Tenho saudades tuas e muiiiitas :))) e sinto a tua falta :)
13h24 - Quero dizer-te uma coisa do coração :)

Vi a minha vida a andar para trás, confesso: carente e meio desesperado, podia esperar-se tudo vindo dali e esta até poderia não passar de outra das suas tentativas de atirar o barro à parede para ver se colava. Pedi-lhe que dissesse. Só não caí de costas porque já estava deitada:

13h28 - Gostmo muiiiiito de ti!!! :) Sinto falta de estar de mão dada contigo. A olhar para ti, beijar-te. Esses momentos queria voltar a partilhá-los contigo :)
Só tu me completas. Só tu me punhas aquele sorriso. Só tu me fazes feliz! :)

Foi bonito, que foi, mas graças a deus eu nunca beijei tal criatura, nem tão pouco lhe dei a mão - neste ponto eu já nem sabia se haveria de rir pelo embaraço de alguém se enganar no número ao enviar uma mensagem destas, ou de chorar por só receber mensagens fofinhas assim... por engano.


be careful with what you wish for

A culpa deve ter sido daquele ataque que me deu de ai, preciso de ter um monstrinho de berço assim. Ou foi do frio, da humidade, do trump ou do raio que parta o freud: sonhei que estava grávida. Estava grávida e, por qualquer motivo, a criança tinha nascido antes do tempo e seria recolocada no meu útero mais algum tempo, apesar de já estar limpa e vestidinha.

Não era feia de todo, mas eu continuava a regatear com a enfermeira: dizia-lhe que aquilo não tinha passado de uma gravidez psicológica, fruto de um susto, e pensava já em entregar a criança para adoção porque não havia forma de ser minha, aquilo tinha de ser um grande mal entendido e eu não queria um monstrinho de berço nesta altura.

Sábia, respondeu-me que uma gravidez psicológica nunca poderia culminar num bebé de vestido amarelo deitado em cima da minha cama.
Quando acordei, ainda estava a tremer.

aqui me confesso

Sempre achei meio tolas aquelas pessoas que vão ao hospital por causa de uma simples constipaçãozita - para me castigar, vou no segundo dia de cama. Literalmente, de cama. 

Podia estar a aproveitar para papar todos os programas com o goucha, a júlia ou a fátima lopes, mas prefiro estar aqui a resmungar e a fazer pequenas sestas que nunca duram muito porque a dificuldade em respirar me acorda mais vezes do que seria suposto.

Estar presa em casa deixa-me rabugenta e com necessidade de doses industriais de mimo que não vou receber porque tenho o dom de arruinar tudo. Enfim. Vou fazer outra sesta.

quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

can't you see this is a land of confusion?

Somos feitos de histórias, mais ou menos curtas, mais ou menos importantes, mas histórias, ainda assim. Dariam um livro. Ou dois; talvez mais até. Escrever-se-iam livros sobre os dias felizes e os dias infelizes, sobre os dias mais ou menos. Sobre todas as cores, todos os sabores, todos os cheiros experimentados: somos o que vivemos, não há nada que enganar nessa estrada entre o passado e o futuro. Não podemos apagar o que fomos e ser qualquer outra coisa sem que existam resquícios do nós original.

É difícil chegar a um sítio sem o comparar com outro qualquer onde tenhamos estado antes; ou porque é mais ou menos bonito, mais ou menos seguro, mais ou menos agradável. Estamos sempre descontentes mesmo no auge do contentamento, porque queremos encontrar um equilíbrio que evitamos a todo o custo por nunca aceitarmos o presente como o é, isento de comparações, de medos, de saudades.

Este é um dos meus erros: toda a minha vida tenho saído nas estações erradas. Ando sempre com as malas atrás, demasiado pesadas para que as transporte de ânimo leve, demasiado cheias para que as queira sequer transportar. Viajo de vida em vida mas nunca fico o tempo suficiente para arrumar a minha roupa toda nos armários sequer; não gosto deste jeito nómada da alma, não gosto de não conseguir ficar em lado nenhum, mas é isto que eu sou.

Procuro os erros antigos de cada história e assento-os no meu presente; busco-os incessantemente como quem procura os indícios de um crime qualquer - encontro paralelismos mesmo onde eles não existem e choro todas as mágoas juntas, as do passado e as do presente, ainda que seja eu a escavar o mais fundo que consigo para encontrar falhas. Preciso de motivos para fugir dos sítios onde mais quero ficar porque acredito que esta seja a forma mais eficaz de não me magoar novamente. Tão errada. Tão, mas tão errada.

Quando sinto o prenúncio de uma nova partida, forma-se um nó no peito do qual nunca me consigo desembaraçar: não me é fácil gostar de alguém mas, quando gosto, gosto de corpo e alma. Entrego tudo o que tenho, ajusto a agenda mil vezes, se preciso for, para bater tudo certo, mudo tudo o que for necessário - e nenhum destes esforços me cansa, nenhum deles me melindra. Gostar de alguém é, provavelmente, o meu ponto mais fraco e, por isso mesmo, o que me deixa mais defensiva.

Hoje é outro desses dias em que tudo me soa a quase-fim e a desistência: ora porque eu estrago tudo o que me faz bem, ora porque há coisas que não fazem grande sentido. Hoje sinto-me medianamente ridícula por tudo o que tenho feito, por tudo o que tenho escrito, e com a sensação de que é tempo de arrumar as malas outra vez e sair enquanto me resta dignidade suficiente para sair pela porta da frente: são as histórias passadas que me obrigam a não tolerar algumas coisas no presente. Chamem-lhe disparate, chamem-lhe egoísmo, chamem-lhe o que quiserem: eu chamo-lhe cansaço. Estou cansada de que as coisas nunca corram bem. Estou cansada de fazer sempre asneira - e estou cansada, acima de tudo, do quão descartável e desprezível eu consigo ser.

cuteness overload

Não sei se é da tpm, se é de estar doente e ter passado grande parte do dia a dormir, se é da moca de ilvico - sério, isto tinha de dar tanto sono? - ou se há qualquer outra causa ainda mais absurda para isto, mas ver os vídeos desta miúda até dá vontade de uma pessoa se reproduzir. 

terça-feira, 24 de janeiro de 2017

personagens

Foram as temperaturas negativas a fazer-me desistir da ideia de vaguear pelas ruas da cidade para queimar o tempo: enregelada e doente, achei que seria boa ideia preencher com cafeína as horas de sono em falta.

Lontra e pobre que só eu, quis crer que nada melhor do que a pastelaria do supermercado, onde me refugiei; estava um calor quase insuportável comparado com o frio da rua. Pedi um café e sentei-me numa mesa que julguei já estar vazia; não estava. Vendo-me afastar o jornal para me sentar, fui fulminada pelo olhar do ancião que tinha ido buscar a segunda ronda do pequeno almoço.

Quando o vi, julguei-o inglês mas, afinal, é produto nacional: tinha um kispo roxo vestido e, por cima, um casaco polar verde alface; esta imagem não seria de estanhar, tendo em contra os dois graus negativos, não fosse o homem estar... de calções. Arrepiei-me só de olhar.

Já sentado à minha frente, porque lontra que é lontra prefere partilhar um momento a sós com um octagenário a mudar de lugar, continuava a olhar-me como se fosse louca. Comecei então a reparar no tabuleiro: cheguei à conclusão de que o bicho já ia na segunda meia de leite e um bolo (ou pão?) qualquer. Não contente, foi buscar um balde de iogurte com pedaços, e devorou-o ali.

O auge foi quando trincou uma banana para a descascar - dizia-me a minha mãe que eu nem a descascar bananas sou normal porque começo pela ponta errada: estou rendida ao método da trinca na ponta.

Vim-me embora antes de perceber se ele ia comer a laranja e beber os dois copos de água que também tinha no tabuleiro - mas fiquei fascinada. Aquele homem consegue comer mais ao pequeno almoço do que eu num dia inteiro, e olhem que eu gosto bastante de comer.

não me lembro da cara dele

Cheguei muito antes da hora marcada e fiquei à porta, indecisa entre tocar à campainha ou esperar que alguém me abra a porta.

Aparece um rapaz. Pergunto-lhe se também vem para a entrevista e ele diz-me que sim; encosta-se à parede e esperamos os dois, olhando o relógio volta e meia para vigiar as horas. Ainda era cedo.

Ele mexia no telemóvel e eu pensava na vida: o som dos elevadores de andar em andar fazia-me lembrar o quão agradável foi subir pelas escadas, até ao 7º andar, tão constipada que achei que ia explodir a meio. Assoava-me em silêncio e tentava explicar a mim mesma como é que acabei à porta de uma empresa sem fazer ideia do que era suposto fazer ali.

Nisto, o moço pergunta, baixinho:

- olha... tu por acaso sabes o nome da empresa? é que eu não...

Respirei fundo, triunfante: graças a deus, deu-me a febre dos blocos de notas. Foi bom sentir que alguém estava ainda mais perdido do que eu.

hoje

[alguma vez tiveste vontade de instalar alguém na tua vida, de lhe apresentar um espaço de ti e dizer: "podes ficar o tempo que quiseres. aqui é a cozinha, esta é a sala e além a casa de banho. o teu quarto é este, por favor, não o deixes desarrumado, põe a tua roupa naquele armário e guarda a tua vida junto da minha naquelas gavetas ali ao fundo. se quiseres ir embora, não te poderei prender - porém, quero que saibas que uma parte de mim irá contigo para todo o sempre."?
sinto a tua falta como se te conhecesse desde sempre; hoje acordei com vontade de te repetir mil vezes a importância que tens na minha vida. culpa dos dois graus negativos que se fazem sentir, da constipação que me apanhou na pior altura e que mal me deixa de respirar, ou culpa das três horas de sono que a cafeína não consegue disfarçar: apetece-me perder-me em ti. apetece-me pousar a cabeça no teu ombro e esquecer tudo. esquecer os últimos dias, esquecer o que nos melindrou, esquecer a mágoa que ainda me faz pensar em ti com algum temor. apetece-me repôr cada peça no seu lugar e não te perder nunca mais.
hoje queria-te aqui, ao meu lado. queria um abraço teu. queria um beijo na testa.
hoje, só hoje, queria repetir o quanto gosto de ti até esgotar as palavras.]

segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

mais uma vez, só deus sabe

Pior ainda do que não perceber nada nos anúncios é não perceber nada na entrevista propriamente dita; a pessoa pergunta, pergunta, pergunta, e o moço só diz que, se formos escolhidos, vamos passar um dia com eles em formação para descobrir isso tudo. Está bem, então.

sobre hoje

Se há coisa que me deixa meio atordoada são os anúncios de emprego - ao início, pensei que fosse de mim, por ser novata no assunto, mas acabei por perceber que é geral e o truque é enviar o currículo mesmo sem fazer a mais pequena ideia do que se trata, afinal, o emprego.

Entre as minhas ofertas de emprego preferidas, residem os anúcios para operário fabril. Não importa se vão fazer alguidares, se vão embalar salsichas ou se vão fazer casacos de malha: ninguém tem nada a ver com isso e operário fabril é operário fabril, ponto final.

Se tivesse voto na matéria, sugeria que se começassem a fazer anúncios tipo:

Emprego Surpresa: envie o currículo e deixe na mão de deus

a ti, obrigada.

[não se cura com remédios nem mézinhas, nem tão pouco existe uma cola especial para colar os cacos do coração. não há terapêutica nem remendos para uma alma ferida: é necessária aquela massa consistente que é feita de sentimentos verdadeiros. é preciso carinho. é preciso bem-querer.

nos dias em que dói tanto que me apetece desistir, tento lembrar-me daquela velha premissa que aprendi há uns anos: não se gosta em linha reta - há dias em que se gosta mais e dias em que se gosta menos, e não há nada de errado nisso. os dias em que se gosta menos não são feitos para desistir: servem para nos fazer perceber o bem que temos e para nos encher o coração de esperança de que existam dias melhores. e para lutarmos por eles também.

hoje era um dia não, e depois apareceste.
nunca me vou cansar de dizer que és diferente, porque és: gosto cada vez mais de ti pelos pormenores ínfimos e absurdos que absorvo do teu ser, pela forma desconcertantemente inocente com que os partilhas como se não fizesses a mais pequena ideia de que ninguém é igual a ti - ou é, mas tanto me faz. foi contigo que eu tive a sorte de ver a minha vida cruzar-se. és tu que me fazes derreter.

hoje era um dia não, e depois vi-te aproximar de mansinho.
quis que me puxasses para ti muito antes de o teres feito; talvez eu seja fraca porque cedo sempre aos teus braços, talvez a minha força resida no facto de encerrarmos as batalhas com um abraço. não sei, nem sei se quero saber: gosto da tua altura. gosto de sentir o teu queixo pousado na minha cabeça e os teus braços a apertar-me contra ti. gosto de me sentir protegida, o teu corpo como um forte, eu e tu como duas peças de um puzzle que não fizessem sentido de outra forma que não assim: encaixadas. 

hoje era um dia não, mas abandonei a cabeça no teu peito.
entrelaçar os dedos nos teus dá-me sempre a ideia de que estamos a fintar as forças que teimam em separar-nos, ainda que essas forças sejamos nós: ferimo-nos um ao outro para nos sararmos a seguir. até que deixe de resultar, até que a brincadeira mate um de nós.

hoje era um dia não, mas gosto demasiado de ti.
quando te olho nos olhos, quando te vejo o sorriso travesso, quando sinto a tua mão no meu cabelo: eu vivi bem todos estes anos sem saber que existias. mas agora sei que existes e sei o poder que tens na minha vida, sei o quanto, mesmo entre lágrimas e uma cabeça confusa, me deixa de coração cheio saber que te tenho comigo - agora sei o que é abraçar alguém durante minutos intermináveis em silêncio: as palavras são desnecessárias. palavras... (dizem que) leva-as o vento, e eu não quero que ele nos arranque nada de nós. que nos despenteie, que nos enregele, que nos abane, mas que nunca, nunca, nos separe.

hoje era um dia não, mas eu não te quero perder.]

domingo, 22 de janeiro de 2017

and i thought it was you

A vantagem de me tornar numa promotora da oriflame, daquelas bem chatas que tentam mostrar as revistas a toda a gente e impingir desodorizantes de pepino e perfumes de esperma de búfalo é que, pelo menos, devia ser presenteada com o betume necessário para conseguir disfarçar os estragos de noites inteiras passadas a chorar - a não ser que na minha outra vida eu tenha sido o hitler, não consigo mesmo entender o que é que eu tenho de tão errado para não merecer ser feliz. E, isso, não há bases nem corretores que consigam tapar: queria algo que fosse bom que não servisse para me deixar ainda pior a seguir. Queria não me sentir tão mal, tão vazia. Tão descartável.

É pedir muito?

sábado à noite

Vinhas-me buscar. 
Aqui, ali, a outro sítio qualquer - tanto me fazia. Nunca me assustou ter de fazer tantos quilómetros para te ver. Nunca me custou esforçar-me por ti - e custava-me ainda menos quando achava que valia a pena, que seria notada. 

Vinhas-me buscar e eu sentava-me ao teu lado: o meu novo regresso a casa. Levavas-me a um sítio especial, a um sítio banal, a um sítio mais ou menos - ou a nenhum sítio, de todo. Levavas-me onde quisesses e, acredita, eu iria estar bem só por estar ao teu lado. Talvez te ouvisse cantar músicas tolas, talvez oscilássemos entre silêncios confortáveis e gargalhadas sobre vídeos parvos que viste no youtube. Não queria saber realmente disso.

Ter-te-ia levado os chocolates - os meus preferidos. Ter-te-ia levado os chocolates porque queria partilhá-los contigo num momento que tivesse tanto de curriqueiro quanto de extraordinário: talvez tenha um quê de romântica que escondo à força toda. Talvez seja ele que me mata. Quem sabe?

Imaginei-me feliz.
Imaginei que vestiria uma roupa bonita que me fizesse sentir mais cinderela e menos gata borralheira. Imaginei o prazer de estar ao teu lado sem os minutos contados, sem tempo a acelerar só para nos chatear, só para nos devolver a uma realidade onde não me é possível perder no teu abraço, onde o teu cheiro não se entranha na minha roupa e eu não me sinto tão calma, tão serena, tão bem - o mais próximo que tenho tido da felicidade. 

Vinhas-me buscar, mas não vieste.
O teu tempo, tão escasso para mim, alarga-se em todas as outras direções certificando-se de que nunca me atinge. O teu tempo não me serve porque nada do que eu faça me torna suficientemente valiosa para que o gastes comigo: perdoo tudo, menos mentiras. 

Foi como se um golpe no peito me tivesse deixado sem fôlego: nunca vou conseguir entender o que tenho de tão errado para que passem a vida a fazer-me mal - por mais complicada que eu seja, fui sempre o mais querida que conseguia, fiz sempre tudo para que visses impresso nos meus gestos o quanto significavas para mim, e o que ganhei em troca foi uma mentira.

Há diferenças entre um não quero e um não posso - a principal diferença estava em não me fazeres acreditar que havia um motivo válido para adiares algo que, para mim, era importante. Podia até ficar triste, mas poupavas-me à humilhação. Ao quanto me custa saber que me mentiste. Ao quanto me dói ter de assumir que, afinal, sou insignificante também para ti - só sirvo para quando não tens nada melhor para fazer.
[chegam sempre à minha vida a perguntar-me como que raio alguém fica tão inseguro a este ponto... e saem sempre da minha vida a dar-me motivos para ser ainda mais insegura.]

sábado, 21 de janeiro de 2017

homens

Não lhe serve para nada, não o deixa pinar, arrastou-o para a miséria e ainda é extremamente desconfortável - mas, foda-se, se um gajo nasce com a maior pila do mundo, não se vai desfazer dela só para ter uma vida normal!

Há coisas que não entendo mesmo - a obsessão pelo tamanho é uma delas.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

0

A vida mete medo às vezes: um dia acordas, olhas à tua volta e parece que a felicidade bateu a todas as portas menos à tua. Talvez seja uma ilusão, talvez aqueles sorrisos não sejam mais do que a farda do dia a dia, obrigatória para todos aqueles que não querem que se saiba que adormecem todos os dias a chorar, os que têm dívidas, os que têm saudades. Os que têm medo. Bem vistas as coisas, usas a mesma farda também: só tu sabes o que sentes.

Há dias em que parece que entraste numa espiral vertiginosa da qual não consegues sair. De acontecimento em acontecimento, os dias felizes são tão escassos que quase nem te lembras deles: e a vida mete medo nesses dias em que temes entrar no comboio errado e sair outra vez numa estação abandonada. 

Olhas para os relógios: três alinhados na parede. Três certos nas horas, nos minutos, nos segundos - três a fazer tic tac em uníssono como quem te grita aos ouvidos que o tempo não pára e que chega de indecisões. Que, de tanto esperar pelo comboio certo, daqui a nada estação fecha e não saíste do mesmo lugar: gostas de ver as pessoas a chegar e a partir. Gostas de ver os abraços fortes no reencontro, os beijos emocionados na despedida - nunca entras em comboio nenhum porque ninguém sentirá a tua falta. 

Ninguém vai ficar de lágrimas nos olhos quando partires e ninguém vai ter os braços abertos de par em par para te receber, se algum dia quiseres voltar: ficas aqui porque sentes a tua vida sem sentido, porque o que fazes nunca vale nada, porque nunca te consegues imprimir na história do mundo. Sentas-te a assistir, figurante na tua própria vida, porque achas que o mais que faças nunca valerá nada: choras a tua sorte e o teu azar. Olhas à tua volta e parecem-te todos tão felizes que não entendes o que deu errado com a tua vida.

A vida mete medo às vezes porque te dás conta do quão pequena és, de que nada te vale usares saltos altos porque nunca serás notada. Não nasceste para isso: aprendes que tens de te resignar à tua insignificância. Deixas que os medos, aqueles que trancaste no sotão, se soltem e se apoderem de ti. Já não tens nada a perder.

Na falta de sítios onde ir, ficas. Olhas à tua volta e ficas aturdida com a quantidade de pessoas, cheiros, cores e sons que existem diante de ti: mas não pertences a lado nenhum. Eles nem sabem que existes.

já vi este filme antes

Nem sempre as coisas importantes para nós são assim tão importantes para os outros: talvez se eu não fosse alguém tão estupidamente só, talvez se eu não estivesse tão sedenta de construir memórias mais ou menos felizes, talvez se eu não fosse alguém que tenta sempre fazer o melhor que pode pelas pessoas de quem gosta, talvez se eu não fosse eu, isto não me afetasse tanto. Mas afeta, caramba. 

Detesto estar entusiasmada com alguma coisa que nunca chega a acontecer. Detesto estar sempre à espera desse momento, que para mim seria especial, e ele escapar sempre, diante dos meus olhos. Para os outros, pode ser uma parvoíce - mas magoa-me mesmo porque sei que sou capaz de mover este mundo e o outro para fazer os planos funcionar. Magoa-me porque tento sempre o meu melhor mas parece que fico sempre àquem - sempre à espera de outros tempos. De tempos em que eu já mereça que façam por mim o que faço pelos outros.

E cansa, que cansa.

o drama, o horror, a tragédia

Sempre vi e ouvi gente a queixar-se das cabeleireiras - ora porque lhes queimavam o cabelo, ora porque têm uma dificuldade imensa em perceber que é possível cortar só as pontas e não é necessário entrar no salão tipo rapunzel e sair uma beatriz costa. 

Eu nunca sofri disso.
A minha cabeleireira é uma santa, uma enviada especial de deus criada à medida das minhas exigências capilares: pode parecer um mito mas, acreditem, é possível dizer faz o que quiseres e sair de lá realmente feliz com o resultado. 

É, provavelmente, a única da espécie que eu vi a trabalhar com prazer, a gostar do que fazia. A esmerar-se para ter um resultado agradável, bonito - e tinha uma paciência de jó para me aturar. A mim e à minha tendência tola para as cores estranhas e para as misturas incomuns.

E agora?
Fechou o salão.


O que é que eu faço à minha vida, deus? O quê?

quase parece doce, quase

Diria que praticamente todas as nossas características são universais. Todas aquelas coisas que achamos que nos tornam especiais são repetidas em vários pontos do mundo, por várias pessoas que fazem, pensam ou sentem da mesma forma que nós.

O que nos torna diferentes é o facto de sermos uma junção aleatória, mais ou menos improvável, de várias características: pode haver muita gente a reagir da mesma forma que nós, mas ninguém é exatamente igual. É nos pormenores que nos diferenciamos, nas coisas ínfimas que só nota quem quer: estas são as verdadeiras palavras chave para o nosso coração.

Essa é uma das coisas que gosto em ti, tal como sei que é uma das coisas que gostas em mim: nós vemo-nos um ao outro como somos. Retemos o que passa despercebido à maior parte das pessoas. Decoramos. Aprendemos. Aprendemo-nos.

Saber de cor o cheiro do perfume ou perceber em menos de nada que algo está diferente é completamente trivial - é, sim. Mas diz muito. Diz tanto.

Obrigada por isso.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2017

#chateada

Tendo em conta que boa parte dos anúncios de emprego que eu encontro são, sobretudo, pessoas a tentar construir equipas da avon ou da oriflame, ainda me vou transformar no próximo guru dos sabonetes e dos esfoliantes e tornar-me numa blogger boa e fofinha daquelas dos sorteios e cenas.

Ou então não.

é o que dá basear-me no harry potter

Gosto de tags. 

Gosto de atribuir tags às pessoas importantes para mim para poder encontrar facilmente as coisas que escrevi sobre elas - nunca uso os nomes próprios, uso sempre algo mais ou menos simbólico. Ou mais ou menos totó, claro; dei-me conta agora de que usei, para alguém do meu presente, exatamente a mesma tag que usei, há uns anos, numa altura negra da minha vida em que me envolvi com alguém que, realmente, não valia o meu tempo. 

Reler o que escrevi na altura teve uma certa piada por pensar em tudo o que eu ainda não sabia naquela data, por tudo o que me aconteceu depois - mas é bom que me lembre de que, apesar de ser uma boa tag, não a posso voltar a usar, tal como não faço questão de repetir essa história.

here we go again

Há um pequeno fenómeno, comum a todos os santos meses, que me chateia um bocado: fico com a barriga inchada durante mais de uma semana seguida. Depois passa - mas, enquanto dura, sinto-me uma grávida de oito meses em depressão. Dói-me a alma só de me olhar ao espelho.

Isto combinado com a minha mais recente obsessão e com a ideia de ter engordado dois quilos conseguiu voltar a meter-me no cantinho das inseguranças para onde eu achei que não voltaria - devia continuar orgulhosa, não envergonhada. 

Não devia deixar que coisas sem jeito nenhum ficassem em looping durante horas na minha cabeça, mas ficam. Dou-lhes um significado bem maior, deixo que me toquem mais do que seria suposto - e pergunto-me como é que cheguei a este ponto. Como é que agora consigo envergonhar-me ainda mais do meu corpo do que antes.

Como?!

é só isto

Está frio, que está, mas este frio não é novidade nem sequer é assim tão estranho se pensarmos que, só por acaso, estamos em janeiro - o que eu acho fascinante, além disto servir de notícia de destaque como se estivesse a nevar em agosto, é lembrarem-se agora dos sem abrigo.

É que, normalmente, eles até gostam de dormir ao fresco. Adoram chuva, adoram geada, adoram o ventinho a bater nos cobertores - é preciso chegarmos às temperaturas negativas para se lembrarem de que eles existem. Sabem... eles já tinham frio antes. 

Já podiam ter feito alguma coisa em vez de fingirem que se preocupam agora.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

a gente habitua-se

Sempre tive medo disso: de me habituar. De aprender a lidar com as coisas que me fazem infeliz ao ponto de não me importar - de me acomodar às coisas que me causam sofrimento porque é mais confortável do que arriscar, do que tentar fazer algo de que goste, do que procurar. Do que lutar.

Nem sempre o útil e o agradável andam de mãos dadas - e é tempo de decidir se sou capaz de suportar aquilo de que não gosto em prol do que preciso. Decisões, decisões.

you,

[hoje apetece-me escrever sobre ti e sobre o que me fazes sentir - saber que o lerás assusta-me exatamente na mesma medida em que me aconchega o coração. saberás que é para ti, ainda que precises de o confirmar. ainda que haja uma parte de ti que te faz duvidar. mas é: não poderia ser sobre outra pessoa.

hoje apetece-me escrever sobre a leveza de estar ao teu lado, sobre como não dei pelo tempo a passar. sobre como desejei, secretamente, que ele parasse, que se atrasasse, que se esquecesse de nós e nos deixasse ficar mais um bocadinho assim: perguntas-me muitas vezes porque fico tão calada; não acho as palavras necessárias quando sinto o teu corpo contra o meu. quando me apertas. quando sinto o bater do teu coração, sempre descompassado, como se batesse no meu próprio peito. não precisamos assim tanto das palavras nesses momentos em que os corpos falam por si.

gosto de ti em câmera lenta: não há ansiedade, não há sofreguidão. absorvemo-nos um ao outro com calma, aprendemo-nos como quem sabe que tem tempo: não sei se temos, mas gosto de pensar que sim. se te tento fugir, volta e meia, é pelo medo que me assola de cada vez que tomo consciência de que posso gostar cada vez mais. há algo de especial em ti, algo de único - algo que, de tanto temer perder, me faz querer fugir antes de me viciar. desculpa por isso.

ninguém é igual a ti. a forma como fazes as coisas derrete-me um bocadinho mais a cada dia que passa - há uma certa doçura na tua hesitação, na forma como demoras sempre a tomar balanço para me abraçar e, depois, nunca mais me deixas, nos rodeios que fizeste até me dares, finalmente, um beijo. há uma certa ternura nos teus passos pequeninos, como quem tem medo de pisar a mina. soubesses tu o quão melhor eu me sinto contigo assim, ao meu lado.

perco-me em ti; o tempo voa mas o mundo parece parado. as tuas mãos a passear pelas minhas costas, os teus lábios pousados na minha testa, na minha bochecha, nos meus. que o momento não acabe, desejo. perguntas porque nunca te digo nada; abraço-te com mais força: estou a dizer-te tudo. gosto tanto de ti, caramba. tanto.

não vás, nem me deixes ir.]

domingo, 15 de janeiro de 2017

every. single. time.

A pessoa mete a pastilha para a garganta na boca e pensa:

Isto não é para mastigar. Eu vou ser forte, vou deixá-la derreter.
Boa, estou a conseguir.
Está a derreter.
Olha como já está pequenina.
Crrrk.
Foda-se, já a trinquei outra vez.

(nunca consegui deixar uma pastilha derreter até ao fim)

de cinderela a psicopata

Em conversa com um amigo, no segundo ano de enfermagem, contou-me que foi prejudicado no estágio porque, segundo a supervisora dele, é insensível, uma vez que reagiu de forma indiferente à morte de um doente com quem, por acaso, ele só esteve dois dias e nem sequer chegou a ver morto.

E eu vi a minha vida a andar para trás e dei por mim a questionar-me se a enfermagem seria o caminho certo para mim, ou se não valeria mais ingressar numa carreira de psicopata profissional. Aparentemente, é suposto que o nosso primeiro morto mexa connosco (ou, se tudo correr bem, que não se mexa de todo). O meu primeiro morto no hospital foi o primeiro morto que vi na minha vida: entrei no quarto e encontrei-o estendido na cama, como se estivesse a dormir. A única diferença é que não respirava - a minha reação foi mandar mensagem, às escondidas, aos meus mais próximos, no auge da emoção: até àquele momento, temia a minha própria reação ao deparar-me com a morte, e fiquei realmente orgulhosa de mim mesma por sentir que não me fez confusão nenhuma.

Todos os que se seguiram, foi igualmente pacífico e, a única múmia que fiz na minha vida foi na última meia hora de estágio, a meu pedido, perante alguma incredulidade dos enfermeiros presentes. Nem percebi o espanto - era algo que fazia parte do meu plano de estágio e que, por falta de oportunidade, eu não tinha ainda feito. 

Posto isto, creio que vou passar um mau bocado quando for, finalmente, aluna de enfermagem: ou aprendo técnicas de maquilhagem perfeitas para fingir que passei a noite a chorar, ou acabo promovida à ala de psiquiatria. Como doente.

(para que conste, esta minha indiferença à morte não funciona quando é o corpo de um dos meus a estar deitado diante dos meus olhos; os nossos nunca deviam morrer.)

almost a love story

[é um alpendre azul com um espanta-espíritos pendurado; gosto de me sentar aqui ao final da tarde e sentir a brisa leve a despentear-me, gosto de ver o azul do céu a transformar-se em negro, gosto de ver as estrelas a surgir lá no alto.

daqui não se vê o mar nem a serra, mas vê-se o céu que é azul e depois negro. respiro fundo. estás ao meu lado, apesar de tudo; olho-te de soslaio, com a mesma desconfiança de sempre. às vezes tenho medo de que sejas uma mentira, uma ilusão. uma miragem. invento desculpas para te tocar, abraço-te, aperto-te com força só para ter a certeza de que estás aqui. e estás, estás mesmo. ficaste.

pergunto-me como. pergunto-te como. sorris e dizes gosto tanto de ti. retribuo-te o sorriso: há algo de mágico nessas palavras, algo que aquece o espírito mais do que nunca - há muito que percebi a diferença entre um gosto muito de ti e um gosto tanto de ti. gostar muito de ti é só isso mesmo: gostar muito. gostar tanto de ti já roça a loucura, essa genialidade e perfeição do ato de gostar: gosto tanto que nem faz sentido. gosto tanto que parece impossível. gosto tanto que nunca fui capaz de me ir embora. gosto tanto, mas tanto, que já não sei não te ter ao meu lado.

olho o céu: a lua, lá em cima, parece um sorriso. a noite está serena como se o mundo tivesse decidido compactuar com o que eu sinto. encaro-te de frente; olhos nos olhos, não consegues conter um sorriso de é tão bom estar aqui. e é mesmo.

abraço-te novamente. apertas-me com a sofreguidão de quem quer fundir dois corpos num só para impedir que se possam separar novamente. daqui não se vê o mar nem a serra, mas vê-se o céu e vejo-te a ti como o sítio onde sou mais feliz. eu também. eu também gosto tanto de ti.

e gosto mesmo.]

sábado, 14 de janeiro de 2017

esta noite

Dormi mal, muito mal. Dei mil voltas na cama, tive mil e um pensamentos, tive saudades. Tive medo. Doía-me a garganta - acordei com ela a mostrar de que raça é feita e a sangrar, coisa que não acontecia há quase um ano (ah, precisamente 10 meses: um dia antes do acidente. isto é o que dá ter uma memória que devia saber apagar o que não importa). Acordei zangada comigo mesma por ter este feitio, e confusa, tão confusa, por saber que estou a fazer tudo o que disse que não faria.

Esta noite, quis colo. Quis um abraço.
E, pela primeira vez, era um colo diferente do de sempre. Outro abraço. Outro conforto.

sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

hoje

É sexta feira 13 e eu acordei triste, outra vez. Demorei a levantar-me da cama como só se demoram os que vivem entediados, adiei o início das limpezas, que decidi serem a fundo, o mais que pude. E fi-las, com o pouco ânimo que tenho tido, com a falta de vontade de quem vê os dias arrastarem-se lentamente.

Depois, o telemóvel tocou. Hesitei. Pensei em várias coisas ao mesmo tempo, senti um arrepio. Questionei-me qual seria o caminho e onde me levaria - depois, desisti. Há de correr tudo bem! 
É sexta feira 13 e foi um bom dia. Um ótimo dia.

the vag life

É certo que o meu lado mais girly não é muito diferente do lado girly de qualquer homem mas, ainda assim, há já uns anitos que ganhei o hábito de me maquilhar regularmente e gosto disso. No entanto, eu maquilho-me sempre, rigorosamente sempre, da mesma forma: base, eyeliner e rímel. Só.

Quer vá sair com alguém especial, quer vá a uma festa qualquer, a um casamento ou comprar ovos ao supermercado, vou sempre mascarada de panda (ah, o drama do eyeliner) a todo o lado, mantendo o trio primordial: base, eyeliner e rímel.

Entenda-se que para mim já foi um grande avanço começar a usar base em pó para fixar a líquida e sabe deus o tempo de demorei a conseguir meter o rímel - serviu-me de orgulho ter um talento inato para o eyeliner mas, mesmo assim, volta e meia passo por aquele drama de querer só um risquinho e acabar com o risco preto quase na testa porque aquela merda nunca fica igual nos dois olhos.

Agora, o problema é outro: meti na cabeça que está na hora de mudar. Que talvez não fosse assim tão má ideia aprender a maquilhar-me como gente grande e deixar de usar sempre a mesma coisa - mas o drama começa quando a pessoa vai ver vídeos de maquilhagem e se perde no meio de tantos pózinhos diferentes, que nem o diabo sabe para que servem, e fica sem entender muito bem porque é que parece ter de possuir 3192 pincéis diferentes. Além de que o resultado me parece sempre exagerado, demasiado artificial, uma fusão entre a belle dominique e o joker - a única coisa que eu queria era uma maquilhagem simples e discreta, não era ir a um baile de máscaras.

Desisto.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

havia uma a ler, graças a deus, uma calada!

Nunca percebi a micro aldeia que é um centro de saúde - aquela coisa de chegar e dizer bom dia a toda a gente como se fôssemos todos amigos, de ser inteirada do estado do furúnculo, de levar com a habitual disputa de maleitas porque, velha que é velha, quer ter a certeza de que é mais doente do que as outras, e ainda ouvir todas as fofocas sobre as marias, as fernandas, os zés miguéis, desta vida que eu não faço a menor ideia de quem são mas, naquele bocadinho que me pareceu infinito, aprendi serem uns porcos, uns ladrões, uns malandros.

Uma pessoa volta para casa com as bichezas recém adquiridas naquele antro de doenças e com notícias mais frescas e fidedignas do que as do correio da manhã - mas eu não digo bom dia nem desejo as melhoras a desconhecidos. Ah, deixem-me em paz!

don't get me wrong

A teoria de que somos a pessoa mais importante das nossas vidas poderá ser verdadeira, mas todos nós nos queremos sentir especiais de vez em quando. Todos queremos ser a pessoa de alguém: estar sozinha pode ser bom mas receber mensagens que nos deixem com um sorriso, sentir que alguém quer saber quando estamos doentes, ter alguém com quem passar horas a fazer absolutamente nada e, ainda assim, parecerem as horas mais bem gastas do mundo, ah, isso é excecional.

Todos queremos sentir que importamos. Que tornámos uma vida um bocadinho diferente porque agora somos imprescindíveis. Todos, sem exceção, queremos sentir esse calor, esse carinho, essa vontade de correr para alguém que nos receberá de braços abertos com a alegria de quem se sente mais completo assim, junto a nós.

Todos nós queremos alguém que goste de nós de uma forma que, às vezes, nem nós sabemos gostar - mas é difícil, sempre demasiado difícil de encontrar. 

ser mulher também é

Ser portadora de genitália feminina é algo bastante mais complexo do que se possa pensar - porque uma parte da gaja não se deixa afetar por aí além, mas a outra parte está a remoer num comentário absurdo que foi mal interpretado, e a gaja tem consciência de que o foi porque sabe que o moço não diria o que a gaja percebeu que ele quis dizer. 

E fica ali, horas, de molho, mergulhada noutro disparate sem sentido porque é insegura até dizer chega  e tem tanto asco do próprio corpo que tudo faz o triplo do sentido se se convencer de que os outros sentem o mesmo.

ser mulher é

Não sabes se vai acontecer, mas já tens três outfits escolhidos para o evento - um para se estiver mais frio do que o suposto, outro para se estiver a chover e, como não poderia deixar de ser, aquele carinhosamente escolhido para o caso de os astros estarem alinhados e quererem cooperar -, já escolheste a cor das unhas, o penteado e só não treinas o sorriso e as deixas porque sabes que é absolutamente inútil e, na hora, nem do teu nome te vais lembrar.

quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

fui destronada e apaguei a tv

Uma lontra está aqui, entediada que só ela, a achar que, do mal o menos, se não se vai realizar em nada na vida, pelo menos ganha o primeiro lugar no campeonato nacional dos preguiçosos. Inocentemente, comenta com um amigo que está a gramar com a novela da sic porque o comando está demasiado longe, do outro lado do sofá - e o que é que o moço diz?

Que é para evitar essas situações que anda à procura de um telemóvel com infravermelhos.


isto

Lembro-me do tempo em que as minhas fugas constantes me faziam sentir orgulhosa de mim mesma: aprendi a mascarar o sofrimento de ódio e a fazer de conta de que não me importava por estar cada vez mais sozinha. Importava-me, claro; mas tinha a ideia de que, não me conhecendo, ninguém me poderia voltar a fazer mal. Nunca reparei que era eu quem me destruía mais. Sempre.

Não desaprendi a fugir: arisca, gatita de rua, dou por mim a tentar escapulir-me sempre que alguém ameaça fazer-me sentir alguma coisa. Perco a alegria por medo de um sofrimento que poderia ou não existir, encaro cada talvez como um não, como uma barreira intransponível, tão alta e impossível quanto aquela que construí à minha volta. Não luto pelas pessoas, não tento uma e outra vez - dou-me por vencida à partida porque nunca me senti boa o suficiente para vencer, fosse o que fosse.

Saio sempre como quem não quer voltar, e volto sempre como quem nunca mais quer sair; não quero, no fundo sei-o bem hoje, agora, que não me sinto a afogar por esse medo irracional que tenho na maior parte do tempo. O erro está em mim e é insustentável esperar que alguém aguente entrar numa vida que parece acontecer em círculos. Não posso pedir que me entendam se nem eu sou capaz de o fazer.

Queria saber ficar. Queria conseguir aceitar o presente e as incertezas do futuro sem tomar a minha infelicidade como certa. Sem me basear em tudo o que já me aconteceu de mau para me convencer de que nada do que poderá advir daqui será bom. Queria ter coragem para me continuar a perder num abraço que me tem feito tão, tão bem... por medo de gostar demasiado. Por medo de me viciar e de o perder. 

É assim, exatamente assim, que tenho perdido boas pessoas.

terça-feira, 10 de janeiro de 2017

esta cinderela nunca aprende.

[insignificante - foi como me senti sempre. 
21 anos de uma insignificância que me consome um bocadinho mais todos os dias. como se estar ou não estar fosse exatamente a mesma coisa. como se ser ou não ser só fosse importante na minha cabeça. 21 anos com momentos onde, aqui e ali, eu achei que era importante para alguém - mas essa ilusão dura pouco, tão pouco, e causa tanta dor que quase desejo que nunca tivesse existido.
hoje é outro desses dias, dos dias em que a minha insignificância me atira para um canto e me faz lembrar de que os meus esforços para ser notada são tão inúteis quanto eu.
nunca ninguém vai fazer metade por mim daquilo que eu tento fazer pelos outros. ninguém; a mim, que nunca importo. a mim, que acabo sempre em segundo plano. a mim.
serei sempre insignificante.]

singularidades

Há um bichinho que vive na cabeça das mulheres e que serve, essencialmente, para plantar a dúvida. A pessoa até pode ter o lado mais racional a dar o litro para impedir esse bicho de fazer-se ouvir - mas ele existe, está lá, e gosta de nos fazer passar pelas loucas que não somos.

Por exemplo, um dia o moço trata-vos pelo segundo nome, por acaso. O vosso primeiro pensamento é que giro... ninguém mais me trata assim! Mas depois surge o bicho, o tal filho da puta que gosta de fazer sobressair o lado mais feminino e maníaco que há em cada uma de vocês, e vem-vos à ideia...



- foda-se! mas quem é a filipa?!

segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

mulher que é mulher

A pessoa pode até não ser de vinganças, que não é, nem tão pouco de desejar mal às pessoas porque o karma é um filho da puta e a pessoa não precisa de mais problemas - mas há um gostinho especial, assim a roçar a felicidade sádica, em constatar que aquela gaja que nos fez mal está cada vez mais gorda.


Vou ficar aqui a ver-te rebolar.

hoje

É uma casa vazia, fria, escura: visto roupa demasiado grande para o meu tamanho, prendo o cabelo no alto da cabeça e entrego-me à solidão desses dias que são tão ou mais gelados no meu peito do que do lado de lá destas paredes que me protegem. Mas hoje não é um dia vazio, frio, escuro. 

O silêncio, pontuado pelo crepitar da lareira, não é ensurdecedor como nos outros dias. O frio enregela-me as pontas dos dedos, mas não o coração: tenho memórias quentes para me acalentar o espírito ansioso por dias bons, por dias melhores. Tenho recordações doces para me lembrar de que nem tudo é mau; tenho palavras, frases, guardadas no ouvido para escutar sempre que me sentir a afundar outra vez.

Era uma casa vazia, fria, escura: agora cheira a pão acabado de torrar e a café forte, quente, amargo. Já não parece vazia, já não parece fria, e a luz está algures, dentro de mim. Hoje não é um desses dias de solidão - visto roupa demasiado grande para o meu tamanho, prendo o cabelo no alto da cabeça mas não me entrego à tristeza; fecho os olhos, sorrio. O que sinto não é felicidade, é paz - e esse já é um motivo mais do que válido para continuar. Para não me deixar perder.

Vai correr tudo bem.

é isto

Há muitas coisas que eu tenho feito erradas nos últimos meses: não por querer, não por não estar sedenta de um recomeço, não por gostar de me sentir assim. Talvez por ainda não ter conseguido ultrapassar tudo. Talvez por estupidez. Não sei.

Utilizo os acontecimentos do último ano para justificar as minhas atitudes, numa altura em que já os deveria ter aceitado e seguido em frente, mas não consigo. Na realidade, não sou capaz de me reconhecer: há meses que não sou capaz de ler. A música entedia-me. Não tenho paciência para os filmes, mesmo os que queria ver há anos. E escrever... obrigo-me para não deixar morrer o cinderela, mas não sinto a minha alma aqui.

A verdade é que não passou um único dia em que eu não tivesse pensado no acidente. Não houve uma única vez em que tivesse pegado no carro sem sentir receio, uma única curva em que não me tenha lembrado daquela em que me despistei. Em que não tenha imaginado isso a acontecer outra vez. Passou quase um ano e eu já não devia usar isto como justificação para o meu mal estar, mas uso - ainda me consome.

Não há um único dia em que não pense na minha tia; da minha janela, vejo uma casa com muitas, tantas, janelas fechadas - e dói. Há dias em que dói menos, outros dói como se tivesse acabado de saber da morte dela: ainda não soube aceitar a perda. Ainda não me habituei à ideia. Ainda choro por isso.

Também não recuperei de todos os dramas com as pessoas - não consigo deixar que alguém se aproxime de mim sem sentir medo de ser só mais do mesmo. Estou cansada de me sentir uma transição, um entretém - mais estação de comboios, menos cais. Sempre que alguém chega à minha vida, sempre que sei que pode fazer-me sentir alguma coisa, lembro-me de todos os que se foram embora. Dos que me deixaram acreditar que era especial e desapareceram. Dos que foram ficando até aparecer alguém melhor - no amor e na amizade, eu nunca sou suficientemente importante para ser a escolhida. Morro de medo de me sentir descartável outra vez - e passo a vida a justificar a minha atitude doentia com estes medos, com estas inseguranças.

Sou má a esquecer. As pessoas, as coisas, os traumas. Sou má a esquecer porque nunca sei ser pela metade, nunca sei gostar só um bocadinho, nunca consigo não me entregar completamente: sinto que há algo de errado em justificar a minha angústia com tudo isto. Sinto que já deveria ter sido capaz de seguir em frente, de ver as coisas boas - de viver os momentos sem medo de como me irei sentir depois. De me entregar sem estar sempre à espera de que isso me venha a fazer sofrer.

Estou tão cansada da minha atitude quanto imagino que todos os outros estão - mas não consigo. Não consigo mudar isto. Não consigo deixar todos estes acontecimentos de lado e ser feliz num momento em que não tenho (quase) nada que me pudesse entristecer - e fico, invariavelmente, ainda mais triste por isso mesmo.

shhh

Falamos muito alto, gritamos. Passamos a vida inteira a tentar ser ouvidos, ignorando que o mundo está cheio de ruído e que ninguém dá por nada: pouco importa o que se diz aos berros. O mais importante, o mais sentido, o mais bonito, diz-se baixinho. Num sussurro como uma melodia perfeita para uma história bonita.

Não sei quais são as palavras gritadas que podem abalar o mundo dos outros - mas sei exatamente o quanto abalam o meu as palavras proferidas junto dos meus lábios. Aquelas que só eu posso ouvir.

sábado, 7 de janeiro de 2017

eternal sunshine of the spotless mind

No acidente, fui presenteada com uma amnésia para o sucedido que me custou a entender e, sobretudo, a aceitar - reconhecer um espaço vazio na minha memória, sabendo que estive sempre consciente, era difícil. Queria entender, queria saber o que aconteceu. Queria lembrar-me. Sentia-me realmente frustrada, como se tudo o que eu quisesse saber estivesse ali, escondido algures, nos recônditos de uma cabeça confusa.

Percebi mais tarde que este foi um mecanismo de defesa. Eliminei as memórias com as quais não sabia lidar - bem vistas as coisas, estou grata por isso; creio que o trauma seria bem maior se me recordasse de tudo o que vivi naqueles minutos. 

Mas dei por mim a desejar poder usar essa memória seletiva noutros campos. Desejei poder acordar amanhã e não fazer ideia de que te tive na minha vida durante dois anos, como se bastasse apagar uma pasta com tudo aquilo que te é referente. Esquecer este duelo entre o coração e a razão - esquecer até que fui capaz, finalmente, de dar a vitória à razão. Esquecer que existes. Tudo o que eu queria era ser capaz de seguir em frente sem que lembrar-me de ti me fosse tão doloroso - sem ter saudades tuas.

Se não me lembrar, deixa de doer, não é?

vira o disco e toca o mesmo

Quando achas um exagero que tanto se fale do mário soares numa altura em que, no fundo, não há nada de novo a dizer e começas a pensar que vais acabar estrábica de tanto revirares os olhos de cada vez que ligas a tv... eis que ele decide morrer e até sentes algumas saudades do tempo em que ele estava só em coma.

o que conta é a intenção, dizem.

Fiz um bolo, qual cinderela da loja dos chineses, gata borralheira dos fornos: feliz da minha vida, experimentei uma receita que nunca tinha feito antes. Tinha tudo para correr bem, mas esta alma inocente não estranhou o facto de a cobertura não levar sequer uma ponta de açúcar. Esta alma inocente confiou nas medidas escritas no papel... e agora teme ser deserdada quando se aperceberem de que o bolo bonito é tudo menos comestível.

Não sei o que é pior: se o facto de a cobertura, por si só, parecer um veneno de tão amarga... ou o facto de eu me ter lembrado no fim que, por achar exagerada a quantidade de açúcar para a massa, só meti metade do suposto.

sábado

É sábado mas a tua vida social ficou alugures, provavelmente agarrada ao útero da tua mãe, e então decides envergar a indumentária de guerra aka roupa com a qual não queres ser vista na rua e que só usas para fazer limpezas e afins. Prendes o cabelo num carrapito, no alto da pinha, e entregas-te à tua versão de lontra obesa; mas dá-te a crise das pastelarias e, já que não dás para mais nada nesta vida, decides fazer um bolo.

Faltam-te ingredientes: desistes do bolo, trocas de roupa ou vais à mercearia assim mesmo e rezas para que não chamem a polícia por te confundirem com um delinquente?
Estou indecisa, mas acho que escolho a última.

about a guy.

Vejo-te ao longe: ali, sozinho, à minha espera na gare, não sou capaz de esconder um sorriso quando os nossos olhares se cruzam. Há alguma coisa na forma como esperas, como te deixas esperar, que me faz querer voltar para sempre; envergonhada, observo o chão, observo o movimento à minha volta, mas não sou capaz de voltar a observar-te a ti até estarmos juntos: é difícil caminhar com um homem tão bonito a olhar para mim.

Quando chego a ti, o meu batimento cardíaco abranda: emanas uma calma que sinto em poucos lugares, e caminhar ao teu lado, mesmo em silêncio, é confortável como se fôssemos companheiros de uma vida inteira e já soubéssemos o caminho de cor sem precisar de palavras a baralhar-nos. Ainda havemos de agradecer aos malabarismos do destino ou de outra qualquer força que nos levou ao encontro um do outro: poderíamos nunca nos ter cruzado. Poderíamos nunca ter descoberto que nos conhecemos a vida toda sem sabermos sequer da existência um do outro.

Gosto de ti. Nem como se gosta de um amor, nem como se gosta de um amigo: gosto de ti numa medida estranha e inquantificável, criada para nós. Gosto de ti como quem quer saber-te de cor. Como quem quer ter tempo para aprender-te as manias, os gostos, os anseios. Como quem quer saber as coisas mais profundas e as coisas mais banais. Como quem quer saber tudo sobre ti e, mesmo assim, deixar espaço para que me surpreendas. Gosto de ti e hoje não sinto medo nem vontade de fugir.

Não gosto de abraços mas adoro perder-me no teu: os teus braços à volta do meu corpo são como um forte que não deixa entrar o medo, a mágoa, a dor. Só há espaço para a calma, para a paz, para a vontade de ficar para sempre com a cabeça pousada no teu ombro e para a gratidão por ter encontrado alguém tão especial como tu. Há algo de diferente em ti, na forma como falas, na forma como és - na forma como me plantas beijinhos aqui e ali e me fazes desejar que esse momento não acabe nunca, na forma como me fazes sentir segura: o teu abraço tem vista para o mar.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

uma ida às compras quase como uma visita de estudo

Irritada com a demora e porque me para sempre o cérebro quando tenho de arrumar as compras nos saquinhos, enquanto o moço da caixa me diz o preço e eu fico dividida entre sacar do cartão ou continuar a arrumar a tralha, porque esta é demasiada informação para uma gaja só, e mais stressada ainda por ter as pessoas à minha espera e a rogar-me pragas, na hora de desenrolar o saco fiquei um bocadinho descordenada.

Ao ver-me atrapalhada que nem uma foca a tentar fazer musculação, o senhor que estava atrás apressou-se a segurar-me o saco enquanto eu atirava as compras lá para dentro porque, passo a citar, não custa nada ajudar. Não o conheço, dificilmente lerá isto mas, ainda assim, por mais insignificante que pareça, é um gesto a assinalar. 

Se o mundo estivesse tão repleto de gente desta quanto está de falsidade e egoísmo, não duvido, seríamos todos muito mais felizes.

(também há a hipótese de ele só me querer despachar, mas vamos acreditar na bondade humana por cinco minutos)

e o stress, senhores?

Por detestar chegar atrasada, apesar de chegar sempre, fiz as compras a correr: atirei tudo o que precisava para o carrinho o mais depressa que podia, qual maratonista do lidl, rosa mota das promoções. 

Cheguei à caixa, feliz da vida, orgulhosa do tempo poupado e convencida de que conseguiria um tempo record mas - para variar - das sete ou oito caixas existentes, só duas é que estavam a funcionar.
Temi passar a páscoa entre aqueles muggles todos, à espera da minha vez.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

a minha alma tem 85 anos, a minha vida social tem 102

Acontecimentos recentes levam-me a crer que não nasci para ser namorada, mulher nem mãe de ninguém - nasci para ser avó. Além da minha afeição exacerbada por chá e por gatos e o facto de ter dado por mim a aspirar um bolo rei, hoje, ao dar-me conta do pouco tempo livre que a programação de festas me deixaria e a grande probabilidade de chegar a casa mais tarde do que o suposto, acabei a adiantar as coisas para o jantar... às dez da manhã.

(Terei salvação?)

terça-feira, 3 de janeiro de 2017

again and again

quando é que nos perdemos desta forma?

[há pessoas que marcam a tua vida para sempre, que serão o teu ponto de partida, a tua bitola. que te farão pensar duas vezes ou três no que vais fazer a seguir, se tem a ver contigo, se tem a ver com ela. a pessoa que procuras em cada pessoa diferente com quem te cruzas - mas sabes, claro que sabes, que nunca mais encontrarás.
tu és a minha pessoa. a tal que marcou a minha vida mas com quem nunca fui capaz de acertar um passo - houve um tempo em que me pareceu que poderíamos ser felizes mesmo com todo o desacerto que nos era característico, que o que sentíamos seria o bastante para que resultasse. não era. mas essa ilusão foi tão doce que às vezes tenho saudades dela. tal como de ti.
não há um único dia em que não pense em ti. és a primeira pessoa a quem eu quero contar quando algo de bom ou de mau me acontece. ou quando não acontece nada e eu quero só falar-te das banalidades do dia a dia, como no tempo em que conseguíamos falar. lembras-te? nunca me esqueci. 
é engraçado mas imagino sempre as tuas reações se te contasse isto ou aquilo. fecho os olhos e ouço-te ralhar comigo pelas borradas que faço com cada pessoa que se aproxima de mim. ouço-te repreender-me a insegurança, ouço-te incentivar a minha felicidade. ouço-te a torcer por mim. mas é sempre só a minha imaginação.
quando te ouvi chamar-me ticas, há uns dias, não consegui conter um sorriso. a tua ticas, como sempre; ouvi-lo foi um regresso a casa, depois de uma viagem atribulada, mas não um regresso feliz. 
não gosto de ti como gostei um dia mas, ainda assim, continuas a ser a pessoa de quem gostei mais - e, mesmo todo este tempo depois, mesmo com todas estas mágoas a deturpar a boa imagem que tinha de ti, eu quis manter-te na minha vida. perdoei-te, contra tudo aquilo que achei que seria capaz de fazer. achei que poderíamos recomeçar - que sabíamos tanto um do outro que valia a pena tentar recuperar a amizade que tivémos antes dos sentimentos terem atrapalhado tudo. acreditei nas tuas palavras: se sentias tanto a minha falta quanto eu sinto a tua, o que poderia correr mal?
tudo.
não adianta pedires desculpa para fazeres exatamente o mesmo no dia seguinte. não adianta dizeres que não me queres perder se nunca tentas manter-me na tua vida. entristece-me, mas não adianta.
não vou continuar aqui, infinitamente à tua espera. não vou.]

não sei.
mas parece-me que nos perdemos para sempre.

ants' exterminator

Gostava de ter uma história bonita e simpática sobre como o novo ano me trouxe inspiração para ter uma fit life como as meninas de bem que cohabitam estas redes sociais, mas é mentira. 

A minha vida é tão interessante que encontrei uma praga de formigas na cozinha e, quando dei por mim, estava a aspirar um bolo rei* e a perguntar-me o que raio ando eu a fazer com a minha vida. Mas poderia ser uma boa oportunidade de negócio.

*entenda-se que estava, literalmente, a aspirar o bolo de aspirador em punho, não a enfardar como é meu hábito.

a melhor parte do natal

Desmanchar a árvore de natal lentamente, como quem mata um inimigo com um sorriso sádico nos lábios, e esquecer que esta época existiu outra vez.

E que volta daqui a menos de um ano.

cinderela, a benanosa

Entendo os pais que decidem não publicar fotos das crias nas redes sociais - o que eu nunca vou entender é aqueles que acabam a fazê-lo, a partir de certa idade, porque já acham seguro.

Vamos lá ver uma coisa: a probabilidade de raptarem uma criatura que já anda, come e fala - além de ir à casa de banho sozinha - é maior do que raptarem um monstrinho de berço que só come e dorme, além de parecer um alien deixado na Terra por engano. Portanto, a não ser que o que vos leva a não partilhar a tromba da criança mal nasce seja uma certa compaixão por quem dispensa ver uma cara de joelho amarelada, não adianta esconderem nos primeiros tempos para depois publicarem fotos da cria de dois em dois minutos, já lavadinha e passada a ferro, com um ar mais apresentável.