[antes de ti:
eu era má no amor. era mesmo, de verdade - se calhar eu era mesmo má na verdade, por levar uma vida regida pelo desamor próprio, pelo desamor pelo próximo, pelo desamor pela vida. antes de ti, eu dizia sempre que era mito, que isso do amor era coisa rara. era fruta cara diante do olhar de um pobre - uma dose de ceticismo e duas de cobardia. tinha medo de assumir que ambicionava um amor para a vida toda. tinha medo de crê-lo possível. e era.
antes de ti, eu não conhecia esta forma de ser feliz. não fazia ideia de que era possível gostar de alguém de uma forma tão livre, tão leve, tão sem medida, como se tivéssemos feito isto a vida toda. está tudo errado mas eu e tu batemos certo: temos virado as costas a todas as adversidades e prosseguido de mãos dadas. temos vencido obstáculos, temos ido ganhando medalhas atrás de medalhas na corrida em que se transformaram as nossas vidas; às vezes caminhamos, lado a lado, com a tranquilidade de quem já se acostumou a viver no holocausto. nos teus braços, meu amor, tudo parece possível.
antes de ti, eu tinha palavras guardadas no armário para mais tarde, todas elas por estrear. e acho que pensei sempre que nunca me chegariam a servir - depois apareceste tu e assentam-me que nem uma luva. assentam-nos. de repente, eu já não estava muito preocupada com o tempo, já não me desculpava com a história da paixão, já não dizia que não passava de tesão. percebi que o que sentia ia muito além dos meus limites. era algo que nunca antes havia experimentado - sentia-me atacada, de forma desmesurada, por um gostar para o qual eu não tinha nome. ou tinha.
perdi o medo. usei a palavra que melhor se adequava à situação - e volta e meia repito-a, certa de que se torna mais verdadeira a cada dia que passa.
antes de ti, eu já era eu - mas era indiscutivelmente menos feliz. e, quase todos os dias, digo que estou mortinha para te abraçar.
adivinha só: é sempre verdade.
sempre.]