Até aos 18 anos - que, só por acaso, acabaram por se converter em 19 porque, depois de mais de 16 anos a ver-me com frequência, ninguém me queria dar alta - as minhas idas ao dentista eram, na verdade, visitas ao serviço de estomatologia do hospital pediátrico.
Portanto, depois de tanto tempo a ser torturada, a pessoa passou os últimos 4 anos a fugir o mais possível das cadeiras dos dentistas, indo só as vezes suficientes para não ficar com uma corrente de ar na boca, que isso é coisa feia de se ver.
Várias limpezas mais tarde, surge o drama: a primeira cárie. A primeira cárie a não ser tratada por um daqueles três médicos que me viram crescer, a primeira cárie tratada por alguém que, até então, só me fez limpezas livres de agulhas - a meu pedido - mas por quem estava mais do que avisada de que, para este tipo de desgraças, teria de ser com anestesia.
Passei o dia a tremer: já me fizeram trinta por uma linha mas, ainda assim, a pessoa estava a morrer de medo da anestesia porque, apesar de lidar muito bem com agulhas no geral, o mesmo não acontece com agulhas na boca. Manias.
A segurar o coraçãozito, já na cadeira, perguntei à dentista qual era a probabilidade de eu conseguir aguentar aquilo sem anestesia. Baixa, respondeu. Tenho duas ou três pessoas que não precisam mas, no geral, todos pedem.
Podemos conversar um bocadinho sobre o quão ridículo é eu ter mais medo da porra da anestesia do que do procedimento em si, mas a verdade é que resolvi arriscar: combinámos que eu levantaria a mão se não suportasse a dor e precisasse mesmo de anestesia. Ela ficou com a sensação de que eu era um bocadinho maluca, e eu fiquei com essa mesma certeza, mas tudo bem.
O engraçado é que... não doeu. O pouco desconforto que senti foi, em muito, inferior ao desconforto que teria sentido se me tivessem anestesiado metade da cara - acho que a dentista pensou que me estava a armar em valente, mas não estava, de todo. Mais: acabei por me aperceber de que nunca nesta vida levei anestesia para tratar uma cárie.
A questão que se levanta é... porquê? Para economizar, por ser um hospital público, ou porque realmente não há assim taaaaanta necessidade de anestesia para isto?
Há apostas?