terça-feira, 6 de março de 2018

cinderela, a insuportável

Falei-vos, há uns tempos, da minha obsessão pelo meu peso - não vamos fingir que isso é algo positivo, porque não é. Atualmente, estou com o meu peso mais baixo em muitos anos, e continuo descontente - não faço ideia quando passei por este número na minha escalada para a obesidade mas, tendo em conta que tenho esta altura desde os meus 12, 13 anos e fui sempre gorda, diria que devia ter uns 10 ou 11 anos na última vez que a balança me indicou este valor. E não irei falar em números, para já. Um dia, lá chegaremos.

Contudo, este post não é sobre os meus problemas com o meu corpo - é mais um ataque de o rei vai nu, uma vez que ultimamente tenho lido e visto bastantes vídeos acerca do assunto, e deparei-me com outra realidade. Parece que, no extremo oposto dos padrões impostos pela sociedade, vive a brigada da aceitação. 

Espera lá... como assim? O quê?!

É que, enquanto de um lado do mundo vivem todos os que querem fazer passar a ideia de que nunca estaremos totalmente bem até nos conseguirmos enfiar numas calças 34 e conseguir continuar a respirar, do outro lado estão os que dizem que ninguém tem nada a ver com os corpos dos outros, que o importante é termos a capacidade de nos aceitarmos, que não faz mal se vestimos o 62 e precisamos de ocupar dois lugares no autocarro. E isto, meus caros, é absurdo.

Tudo bem, o corpo é vosso: tatuem uma pila na testa e perguntem-me se eu me importo. Agora, não me venham dizer que não há algo de errado convosco e que estão muito felizes com o vosso corpo quando têm de usar uma mão para levantar a barriga quando querem lavar a xaroca (adoro o termo, lidem com isso). Porque eu também vi isto: gente (muito) gorda a dizer que está feliz e bem resolvida com o corpo que tem. Ótimo, ainda bem! O único inconveniente é que, no caso de ninguém reparar, ser gordo, ser obeso, traz problemas bem maiores do que o drama estético da coisa.

Cinderela, sua falsa, pessoas fit também adoecem!
Claro que sim. E, imaginem só, também morrem! A questão aqui é que isto nunca deveria ser usado como argumento para não se fazer algo pela nossa saúde. Há gente gorda mais saudável do que gente magra? Há, sim! Eu fui uma delas, durante algum tempo: ao contrário de algumas colegas esqueléticas, estava tudo bem comigo. Ou, pelo menos, eu achava que estava, até ter ficado sem a vesícula aos 20 anos e ter, finalmente, percebido isto: estamos todos sujeitos a determinadas doenças, e ser magro não é sinónimo de nos tornarmos imunes, mas ser obeso há de sempre, sempre, trazer consequências a longo prazo. Para quê sujeitarmo-nos a isso? Não nos bastam as doenças que não nos dão opção de escolha? 

O mais aborrecido nos gordos é que as nossas desculpas são universais: ai, que até o ar me engorda, ai que não consigo emagrecer. Gente, eu disse isto durante anos a fio! Achava mesmo que tinha uma tendência natural para a engorda e que estes quilos não me saíam de cima por nada deste mundo. E sabem o que descobri também? Bem... era mentira. Eu é que não estava a tentar o suficiente; assim que os problemas de saúde me obrigaram a parar de comer tudo o que me apetecia, eu perdi peso sem dramas. Sem dietas loucas, sem batidos de repolho com beterraba, sem comprimidos mágicos. Na verdade, eu nem engordo assim com tanta facilidade - e, quando tento, quando me esforço, perco peso bem rápido.

Sou magra? Não. Ainda estou a meia dúzia de quilos do peso que quero porque, apesar de ter parado a dieta quando cheguei a um peso em que me sentia bem, há mais de um ano atrás, atualmente esse número já não me serve e eu preciso de perder mais. Ainda assim, toda esta experiência abriu-me os olhos: o importante é ter saúde, como diz a minha avó. E aceitarem-se, sim, mas não se acomodarem num peso que não vos faz felizes e que vos trará dissabores a longo prazo.

7 comentários:

Agridoce disse...

Acho que é tão cansativa a obsessão pelo corpo perfeito, como a obsessão pela aceitação do corpo doente.

Porque sim. Um corpo obeso é um corpo doente. E não, não me apetece ser politicamente correcta e alinhar nessa conversa de que temos de nos aceitar como somos.

Obrigada por pores em palavras o que eu também penso tantas vezes.

Sejamos saudáveis, que é mesmo o que importa!

disse...

Também há fumadores que morrem aos 90 sem nunca terem cancro do pulmão, assim como há quem atravesse a rua fora da passadeira, com os olhos no ecrã do telemóvel e nunca foi atropelada. E "dantes é que era bom" quando havia pessoas que morriam muito velhinhas e saudáveis, sem nunca terem ido ao médico, quando é certo e sabido que a esperança média de vida, desde a década de 60, subiu mais de 20 anos (refiro esta década porque foi quando o meu pai morreu, com 62 anos, que era, exatamente, a esperança média de vida naquela altura).
Generalizar quando nos dá jeito, é uma tendência natural, mas não pode ser geral.
Deixem de fumar, fechem a boca e façam exercício. Até podem morrer aos 30 com uma caganeira, mas as probabilidades de terem uma das doenças da moda, relacionadas com a alimentação, diminui drasticamente.
Quem me dera ter a tua força de vontade... e a tua idade. xD

ernesto disse...

Agridoce, sem dúvida que, independentemente do corpo, o importante é sermos saudáveis. Acho que o mundo anda de borda em borda e nunca mais acerta.

Jota Esse, ser magro não é um livre passe para a longevidade mas, sendo obeso, é mais difícil de lá chegar. Até porque andar cansa mais xD a força de vontade veio do susto, não te iludas :)

disse...

"a força de vontade veio do susto, não te iludas :)"
Um dia viste-te ao espelho e... - ai que susto. eheheh
Estou a brincar. Andei a "cuscar" e estás muito bem na nova foto de perfil... xD

ernesto disse...

Nem isso. Nunca tive a verdadeira noção do corpo que tinha, até ter realmente comparado o antes com o depois :)

AxelleDara disse...

Desde que deixei o blogger, o Quem é que deu erva à Cinderela foi o único espaço a que fui dando uma olhadela de quando em vez, e a verdade é que continuo sempre, sempre a concordar contigo e a identificar-me contigo (juro que isto é quase bizarro e que deves achar a certo ponto que sou uma fan girl que faz os possíveis para criar paralelos entre nós, mas acho que não só pensamos de maneira parecida como devemos também passar por experiências mais ou menos parecidas).
A verdade é que o movimento (comunidade?) Body Positive me tem ajudado bastante a controlar a minha obsessão com o peso (a minha obsessão fugiu-me do controlo há coisa de um ano e meio atrás, estava a fazer uma dieta super restritiva, evitava festas e convites de amigos com medo de comer coisas pouco apropriadas, saltava refeições para "compensar" o que tinha comido/ia comer mais tarde... Enfim, comportamentos estúpidos e absurdos e quase a roçar a linha do distúrbio alimentar, o que fez com que atingisse um peso de menos 10kg do que tenho atualmente), mas sim, às vezes choca-me o quanto as pessoas fazem uso do "estar confortável na própria pele" e do "não ligar aos ideais de beleza instituídos pela sociedade" como quase desculpa para evitar um estilo de vida saudável. E o pior é que se alguém diz "Desculpa, mas uma mulher de 1,65 m não devia pesar 85kg, acho que devias tentar perder peso", de repente essa pessoa já é um body shamer, um "fatophobe" ou outras coisas do género.
A maior das aulas que tenho já são no hospital, e é incrível como a grande parte (à vontade 85% dos pacientes) das pessoas hospitalizadas são obesas... Aliás, quando temos pacientes de peso saudável, até os professores comentam que não são os pacientes típicos. E isto assusta-me imenso.

ernesto disse...

Axelle, está descansada que entendo o que dizes e nada tem a ver com seres uma fan girl ahah ainda bem que assim é!
É muito bom as pessoas conseguirem aceitar-se, mas entre aceitares um corpo que não se encaixa perfeitamente nos padrões da sociedade, porque tens aquela barriguinha chata que não quer sair, porque, sei lá, sentes que ainda não és a barbie, e aceitares um corpo obeso, que te está a matar lentamente, vai uma grande diferença. Acho que é aqui que as pessoas se estão a perder :|