Para ti, que és obeso, e sentes que não há volta a dar, só tenho duas palavras: eu também.
Eu também usei, durante anos, a desculpa de que até o ar me fazia engordar, e não conseguia emagrecer por mais que me esforçasse, até que a saúde me puxasse o tapete e eu acabasse por entender que, afinal, não me estava a esforçar o suficiente. E que o ar era, nada mais nada menos, que todas as porcarias que eu comia sem a mínima noção das facadas que estava a dar em mim mesma.
Sinto uma pontada de desespero de cada vez que leio um post de uma pessoa obesa - e aqui confesso que só tenho visto mulheres - a dizer que é uma gorda saudável - meu deus, eu também. Eu também dizia isto! E... era mentira. Embora eu não fizesse ideia.
Se se estiverem a perguntar, a resposta é não: não comento este tipo de publicações. Reviro os olhos e sigo com a minha vida porque, por mais que eu julgue ter razão, sei que o meu comentário seria sempre visto como algo desnecessário e maldoso. Gordofobia, como o povo agora adora dizer. Só que não. O meu problema é estar de fora e conseguir ver o que elas não conseguem.
Cinderela, agora excedeste-te.
Deixem-me contar-vos um segredo: eu não fazia ideia do corpo que tinha. Sinceramente. Choramingava por ser gorda, odiava ver-me na roupa - que, aliás, era um 31 para encontrar algo que me servisse - mas posso garantir-vos que só tive consciência do quão gorda era, quando mudei. Quando coloquei duas fotos lado a lado, numa daquelas montagens que eu antes julgava serem exibicionismo, e me obriguei a ver o quanto tinha mudado.
O que me causa alguma comichão não é o facto de esta ou aquela pessoa ser mais gorda, ou ser obesa - francamente, passa-me ao lado. O que me chateia é esta tentativa constante de se normalizar a obesidade, de se chamar a alguém, com 30 ou 40kg a mais, modelo plus size. Ou, pior ainda, mulher real.
Já escrevi sobre isto, mas não me canso de o repetir: acho tão nocivo darem a entender que não há nada de errado em ser-se obeso, quanto aquela velha moda de que o corpo ideal é ser-se tão esquelética que dá para fazer da coluna vertebral um reco-reco. A grande diferença entre eles é que, se até para a magreza extrema as pessoas encontravam um limite, na obesidade parece não haver teto. Não importa se tem 5kg a mais, ou 45kg. Tudo entra no conceito, tudo é bonito. E, o pior de tudo, tudo é aplaudido por outras pessoas em condições semelhantes.
Entra-se na onda de que, se aquela pessoa, com tanto peso a mais, é bem sucedida, vista como um modelo, uma mulher real, então eu também posso ser. Esforçar-me para quê, se o que importa é aceitar-me?
Aceitarem-se, sim. Amarem-se, sempre. Mas o amor próprio deve incluir, em primeiro lugar, a saúde.
Há fatores genéticos, hereditários, hormonais, tudo o que quiserem, que aumentam a predisposição para engordar, sim - mas existem também muitas pessoas penduradas nesta desculpa para não terem de se esforçar por mudar. Afinal, nem sequer estão sozinhas no mundo, e cada vez mais há roupa plus size.
Uhm uhm.
Acho importante clarificar que eu não sou um exemplo para ninguém: apesar de falar imenso no quanto gosto de comer, a verdade é que, neste momento, tenho uma péssima relação com a comida. Na maior parte do tempo, todo e qualquer prazer que possa sentir ao comer algo de que goste muito, é abafado pelo sentimento de culpa. E, quando a culpa não é pelo que comi, é pelo simples facto de sentir fome quando eu decidi que não ia comer.
Para metermos os pontos nos is, quero deixar claro que este post foi escrito por alguém com excesso de peso: são 72kg de sensualidade distribuídos por 1,68m de gente. Já pesei 96kg. E esta informação é medianamente irrelevante mas é inegavelmente libertador sentir que sou capaz de o escrever. Pela primeira vez na minha vida, eu não sinto vergonha do meu peso. Mesmo que não esteja onde quero, mesmo que continue a lutar com a balança.
Perder peso não resolveu todos os meus problemas, não sou uma pessoa melhor só porque passei das calças 48 para as 40, ou porque a maior parte das camisolas que compro agora são o S. Não é disso que se trata, de todo. Mas posso garantir-vos que, mesmo nos dias em que barafusto com a minha imagem, gosto mais de mim hoje do que fui capaz de gostar durante os primeiros 21 anos da minha vida, se fosse possível compactar todo esse desamor e transformá-lo num só. E o amor próprio não tem preço.
O que quero que retenham deste post é isto: vale a pena fazerem algo por vocês. Vale a pena tentarem mudar. E, quando o fizerem, mesmo que às vezes duvidem, vão sentir-se melhor do que nunca.
Para quem tiver curiosidade, no instagram poderão encontrar um antes e depois: @quemdeuervaacinderela.