domingo, 30 de novembro de 2014

carta a quem nada digo

Vivia na ilusão de que o mais difícil era passar semanas sem notícias tuas, mas esta é só a prova mais pura da minha inocência - o mais difícil é, de longe, saber de ti todos os dias. Especialmente agora, num desses momentos em que a vida te pregou uma partida e estás a sofrer, talvez mais do que nunca. E eu lamento tanto, mas tanto, não poder estar ao pé de ti, que tenho feito os possíveis para manter a minha presença certa, ainda que silenciosa e anónima, na tua vida, de forma a ir ajudando sem que nunca chegues a saber que era eu que estava por trás do que te tem chegado a casa, como um pequeno mimo que se dá aos que mais gostamos. Mas isto está a dar cabo de mim.

Se me pudesses ouvir agora, dir-te-ia que não ligasses a quem te diz que tens de seguir em frente. Tens, mas também tens todo o direito de fazer o teu luto como bem te apetecer, até estares preparado para voltar ao mundo dos vivos. Precisas de te dar a esse luxo até aprenderes a viver com essa dor miudínha que nunca mais te vai abandonar e vai aproveitar para se instalar sempre que estiveres distraído - é por isso que precisas desta pausa e não deixes que te proíbam de a fazer. Mas tu não podes nem queres ouvir-me, e estás no teu direito.

Não sou um número no teu telemóvel a juntar-se às chamadas que não atendeste nem às mensagens que não leste - como disse, mantive-me quieta, silenciosa, distante, apesar de me estar a magoar saber de ti a toda a hora, saber o que te aconteceu, saber como aconteceu. Saber do teu estado. Fui sofrendo contigo,e por ti, como se esta dor também me pertencesse. Como se as nossas vidas ainda se cruzassem em vez de eu estar a assistir ao desenrolar da tua vida num lugar privilegiado da plateia mas, ainda assim, num lugar que tu nunca vês.

E com isto acrescem-se as saudades e a dúvida - se eu tivesse dito que sim poderia, neste momento, estar sentada ao teu lado? Provavelmente sim, provavelmente não. Talvez isto não seja mais do que aquela velha mania, intrínseca às mulheres, de tentarem convencer-se de que tinham o poder de mudar tudo. Mas talvez eu nunca tenha podido nada, sei lá.

Sei que isto está a matar-me aos bocadinhos, meu amor, e eu sou demasiado nova para morrer por quem nem se lembra de mim. Também sei que despedidas comigo nunca funcionam porque eu acabo sempre por encontrar um qualquer motivo para voltar atrás - mas hoje estou particularmente cansada de me manter nesta posição ingrata enquanto, provavelmente, outras estarão na ribalta ao teu lado, mais indiferentes, menos apaixonadas. Menos entregues a ti e ao teu mundo mas, mesmo assim, mais perto. E eu que demorei meses para entender a dimensão do que sentia, fico aqui, condenada a não te ser mais nada do que a memória distante de algo que podia ter resultado mas eu fiz com que se perdesse. Mas já é tarde para o lamentar e mais tarde ainda para esperar ainda te fazer falta - por mais que me custe admiti-lo, estás melhor sem mim. E hoje não me apetece ser triste. Amanhã talvez eu volte a investir em mais uma tentativa falhada como um barco que, levado pela maré, continua a embater nas rochas até se destruir de vez, mas hoje eu quero parar e quero aprender a ser feliz longe de ti. Hoje não.

Sem comentários: