sábado, 29 de outubro de 2016

vinte e nove de outubro de dois mil e dezasseis

Mais depressa desce jesus, em pessoa, dos céus para dar uns açoites nuns quantos do que os gajos percebem que aquela conversa de ah, eu até costumo ter problemas com as miúdas porque tenho a pila demasiado grande não cola.

A sério, atentem: NÃO COLA. NÃO PEGA. NÃO ATRAI.
Se estão a falar com alguém, tentem ser mais do que aquela pendureza minúscula que guardam nos boxers. Tentem ser interessantes, sinceros, engraçados. Tentem usar a cabeça de cima e, acreditem, o tamanho deixa mesmo de importar.

Se começam logo a insinuar que são portadores de um adamastor... 


socorro

Faltam quase dois meses, mas já vi lojas decoradas com enfeites natalícios e acabei de ver uma publicidade do minipreço a falar de uma mãe que está a preparar a consoada.

cinderela, a vingativa

Nunca fui de vinganças, mas também nunca fui pessoa de muita paciência - se há coisa que me chateia são as pessoas lerdas que, infelizmente, conseguiram tirar a carta de condução. Devia ser proibido.

Vinha para casa, com o humor instável dos últimos tempos - sério, esta pessoa canta, dança e bate palmas, mas no momento a seguir lembra-se de que o gajo também cantava, dançava e batia palmas, e começa a chorar baba e ranho que só visto! - quando vi um carro parado numa curva apertada e manhosa.

Isto irrita-me particularmente: gente que mete em risco a sua segurança e a dos outros e pára onde lhe apetece, sabe deus porquê, chateia-me mesmo a sério - se já não sabem o que andam a fazer na estrada, fiquem à lareira, pronto.

O velhote arrancou mal eu passei, cheio de pressa; coladinho a mim, preparava-se para ultrapassar, quando me ocorreu que ele não merecia. Aproveitando o facto de não vir ninguém no sentido contrário, meti-me a meio da estrada a andar a 40km/h...


... e abrandava um bocadinho mais de cada vez que, pelo retrovisor, o via bufar.
Provavelmente ele achou que eu sou só mesmo uma slow driver e não entendeu o porquê, mas eu diverti-me pra caralho. Ten points to gryffindor.

quinta-feira, 27 de outubro de 2016

sobre as saudades

[naquele dia, não queria vir-me embora: demorei-me no teu abraço, demorei-me em cada beijo. queria ter ficado ali, com a cabeça apoiada no teu ombro, para sempre. o sentimento de segurança, o carinho, a calma, estavam todos lá. naquele dia, queria ter ficado contigo.

quando me fui embora, olhei para trás: ainda me seguias com o olhar mas desviaste-o de repente. estava longe de imaginar que aquela era a nossa derradeira despedida, que aquele era o último beijo, a última vez que me sentia tão confortável com o corpo encaixado no teu. e tenho saudades: saber que não as posso matar, dói. saber que não sentes a minha falta, dói mais ainda - soubesse eu e ainda hoje não te teria largado.

ainda hoje estaria ali, alheia ao mundo, perdida no único sítio onde me senti realmente bem em tanto tempo: no teu abraço. ainda hoje não me teria despedido de ti.]

ainda do mesmo realizador de "vou fazer um taco e um ró x"

- menina, ajude-me a ir à casa de banho. meteram-me um cristel* porque eu já não obro há muitos dias!

*sim, um clister.

quarta-feira, 26 de outubro de 2016

é o seguinte

Tudo bem: eu compreendo que a grande maioria das pessoas que vão parar às urgências são suficientemente jovens para terem convivido com os dinossauros em saídas à noite, e eu não me queixo que, para muitos, a única forma de comunicação existente seja à base de fios de baba e jorros de ranho. A sério. Eu lido bem com isso.

Agora, plamordeus, quando me aparecem jovens simpáticos, capazes de ter uma conversa e que entendem que o turno está a ser particularmente caótico e que, por isso mesmo não é possível fazer as coisas com a rapidez que seria ideal, que compreendem, enfim, façam-me o favor de NÃO LHES DAR ALTA EM MENOS DE NADA!


A minha sanidade mental agradece.

tenho um bloco de notas no bolso só para poder dar autógrafos

Às vezes tenho a sensação de que as pessoas que me veem no hospital me reconhecem, que sabem que eu sou a cinderela. Porque outro motivo eu haveria de ver tantas mãozinhas esticadas, a tentar tocar-me, sempre que desfilo no corredor atulhado de macas?


Tímidos e discretos, os meus fãs pedem-me arrastadeiras, água, cobertores, ajuda para sentar, que chame o médico ou ainda, em tom mais ou menos ameaçador, perguntam-me quando é que vão ser atendidos - fazem tudo para que ninguém note que me conhecem. 

Eu sorrio e aceno com um ar discreto, também: a fama assenta-me bem.
e faço o que me pedem, que me fodo!

terça-feira, 25 de outubro de 2016

ohhhh, but it's too late to apologizeeee!

Não nos conhecemos há muito tempo, mas ganhou o hábito de me ligar: como passa a vida a enviar-me fotos dos gatos e diz tantos disparates quanto eu, as conversas com ele ocupavam-me a cabeça e faziam-me rir o bastante para que eu atendesse.

Ontem, disse-lhe que estava cansada, que queria ir dormir - ele não. A meio de uma viagem de carro, queria que lhe fizesse companhia, mas não cedi: argumentando que me levanto cedo e que os dias têm sido difíceis, desliguei. Não me apetecia falar, confesso, mas estava realmente cansada. No entando, lembrei-me de que tinha deixado um amigo pendurado quando atendi a chamada, e acabei por lhe responder e ficar a falar um bocadinho.

Aí, começou o rol de mensagens: que afinal não tinha ido dormir, que estava desiludido, que eu estava a gozar com a cara dele, que o tinha deixado pendurado para ir falar com outro, que o tinha magoado. O exagero provocava-me um misto de irritação e de espanto: não temos uma relação suficientemente próxima ou sólida para que ele me faça um drama destes. Em menos de nada estava, atónita, a explicar-lhe que não somos namorados e que não lhe devo nada. Só a muito custo não o mandei para o caralho.

Esta história não teria tido qualquer relevância se, num momento de lucidez, eu não me tivesse dado conta de que eu e ele somos iguais: quantas e quantas vezes não fiz exatamente as mesmas perguntas? Quantas e quantas vezes eu não disse exatamente as mesmas coisas? Muitas. Tantas. Demasiadas.

Demorei uma (meia!) discussão a querer mandá-lo embora. A sentir repulsa, a não perceber o porquê de estar a ser posta em causa daquela forma: eu fiz isto durante meses e meses a fio. Dia após dia, deixava que as minhas inseguranças me levassem a fazer os mesmos dramas, pelos mesmos motivos absurdos. E ontem percebi o outro lado. Ontem percebi que fiz mesmo merda, que devia ter beatificado o gajo por me ter aturado tanto, em vez de achar que fui usada quando se fartou.

Ontem, percebi que eu não sou capaz de aturar por um dia o que o fiz passar durante meses - for real, não é mesmo exagero. Por isso, e já que agora estou a sentir-me particularmente culpada, imaginem-me a chorar abraçada a um frango.


Este gif não faz sentido neste post, tal como a minha atitude neste mundo. Ah pá.

dos criadores de «vou fazer um taco»

- então e agora vou fazer um ró x, não é? e depois não tenho de o levar para baixo? como é que o sô doutor vê a minha chapa?


É isto que as pessoas fazem no hospital: tacos e ró x.

segunda-feira, 24 de outubro de 2016

it's a little bit funny

Sempre que digo a alguém que tive um turno difícil, que tinha sido dia de casa cheia nas urgências, a primeira pergunta que me fazem é:

- então, muitos acidentes?

... porque toda a gente imagina que o que mais se vê nas urgências são ambulâncias a chegar com pessoas semi-desfeitas e orgãos ao pendurão quando, na verdade, na grande maioria das vezes, estão só cheias com obstipações, dores de barriga, de costas, de cabeça, falta de sono, e cenas do género.

a paz no meio do caos

As pessoas desiludem-nos porque nós deixamos: convencemo-nos de que elas podem ser mais e melhor, de que podem ser os nossos super-heróis e salvar-nos das tormentas que parecem não cessar. Mas não podem: ninguém nos pode salvar nos dias maus, ninguém nos pode tirar do inferno, muitas vezes criado por nós, em que vivemos, ninguém nos pode apagar o passado nem acabar com a maré de azar em que parecemos ter mergulhado.

É um erro achar que uma pessoa pode ser mais do que uma pessoa: se esperarmos que alguém desempenhe um papel heróico na nossa vida, vamos mesmo desapontar-nos. Os super heróis são os outros: o amigo que fez mais de 100km e passou duas horas a ver-me chorar, a amiga que me deixa acampar no sofá dela, a todos os que mal me conhecem no hospital e me encheram de abraços e beijos inesperadamente. Esses são os verdadeiros heróis: aqueles de quem eu não esperava absolutamente nada e, só por isso, não poderiam ter-me surpreendido mais, não poderiam ter-me feito melhor. E devolveram-me o ânimo: caramba, não estou sozinha! Há sempre mais e melhor no mundo do que aquilo que somos capazes de ver quando estamos em desespero.

E por isso tudo, obrigada. Obrigada a todos.

they know better

Minha querida, vais aprender, ao longo da vida, a ser mais filtro e menos esponja.

Detesto as pessoas exatamente na mesma medida em que sou apaixonada por cada uma delas.

every single day

- olhe, avisaram-me agora de que tem mais um exame para fazer. vai sentar-se naquelas cadeirinhas ali à frente, já a chamam para fazer a TAC, está bem?
- vou fazer um taco para quê?*

* esta confusão tac-taco é o pão nosso de cada dia, mas tem mais piada quando se trata de pessoas jovens, como era o caso.

domingo, 23 de outubro de 2016

os meus preferidos são estes

Um jovem de 95 anos, com uma vivacidade de fazer inveja, uns minutos depois de ouvir uma conversa entre mim e uma enfermeira, a propósito dos banhos, chama-me:

- ó menina, eu queria falar com a menina dos banhos.
- diga...
- é com a menina dos banhos! é você?
- posso ser, diga lá.
- é que eu estive a pensar... o banho fica para amanhã, está bem? 


gajas

A pessoa que choraminga e se lastima porque vai passar o fim de semana trancada em casa e isso é, claramente, demasiado tempo para pensar, é exatamente a mesma pessoa que recusa convites para sair porque isso implica despir o pijama e lavar o cabelo antes da hora a que tencionava fazê-lo.

(a preguiça deveria ser um direito em dias de chuva)

quarta-feira, 19 de outubro de 2016

só para informar

Estou viva, ainda que não necessariamente de boa saúde - não abandonei o blog nem me esqueci das minhas obrigações de cinderela, mas preciso de tempo. Volta e meia, viro a vida do avesso. Volta e meia, choro outra vez.

Estou nessa meia volta: na volta das lágrimas.

Mas passa, não passa? Claro que sim.

(até já.)

segunda-feira, 10 de outubro de 2016

nunca pensei ser capaz de me apaixonar por um rapaz 4 anos mais novo


Mas olhem, aconteceu. Já tenho o casamento e o nome dos quatro primeiros filhos planeados, só falta ele saber que eu existo.
E cantar para mim todos os dias.

domingo, 9 de outubro de 2016

era uma vez uma música estúpida que contava a minha história


E era esta.

se ainda valesse a pena falar, era isto que lhe diria.

Quando penso em ti, penso sempre no nosso início. Na amizade leve, sem grandes pretensões, que tínhamos - as conversas de horas e horas, as gargalhadas, as partilhas, a curiosidade crescente. Lembro-me da forma lenta, leve e doce como os sentimentos se foram instalando. Na forma como, quando dei por isso, estava completamente apaixonada por ti, ainda que isso nem sequer me parecesse uma hipótese viável, coerente. Não fazia sentido nenhum, mas fazia-me feliz e isso bastava.

Quando penso em ti, penso sempre nessa parte boa e feliz da nossa história absurda - depois, vieram os primeiros dramas. Veio a minha insegurança meter tudo em causa, veio a minha impulsividade minar os teus sentimentos, a forma como me vias. E tinhas razão: entendo-o agora, com a clareza que só a distância permite. Eu não sou boa a gostar nem sou boa de gostar: os meus medos, a minha insegurança, tornam-me numa pessoa doentia de que eu própria fugiria a sete pés. Desculpa. Mil desculpas nunca chegarão para expressar o quanto lamento o que nos fiz. Mas está feito.

Quando penso em ti, tento nunca pensar no facto de me teres deixado a tentar sozinha. Tento não me lembrar de que não te esforçaste o suficiente, tento não pensar que poderia ter sido diferente: abandonaste-me ainda antes de teres motivos para isso. Nunca foste capaz de lutar, um bocadinho que fosse, porque deste a batalha por perdida ainda antes de começar. Tento não pensar nisso porque quero guardar só o que tenho de bom de ti.

Passaram-se praticamente dois anos e parece uma loucura que tenhamos acabado assim: a vida trocou-te as voltas de repente. Puta. Se há pessoa que não merece nada do que lhe aconteceu, és tu. Não mereces tanta dor, tanto azar, tanto desespero. Não mereces mesmo, acredita. Mas queria que tivesses notado que, durante todo este tempo, estive a tentar que percebesses que eu continuaria aqui, tal como naquele início em que eu penso sempre. Estaria aqui sempre, porque acredito que vales a pena. Acredito que és mesmo uma excelente pessoa, mas falhaste demasiadas vezes comigo.

Perdi a conta às vezes em que acabei a chorar por tua causa - ainda agora, neste momento, o faço. No dia em que me disseste, pela primeira vez, que já não sentias nada por mim, achei que te poderia reconquistar: foram as saudades daquele início que me prenderam, durante meses, que me mantiveram firme na minha decisão, ainda que me fizesses chorar dia sim, dia não. Um dia cansei-me e fui à minha vida: acreditei que a nossa relação teria muito a ganhar se eu conseguisse distanciar os meus sentimentos de ti. Fiz um esforço para conseguir seguir em frente e, quando consegui, finalmente, cometi o erro crasso de achar que agora tínhamos tudo para recuperar a mesma amizade despretensiosa de antes: ao invés, perdi-te. 

O que sinto por ti neste momento é um misto de preocupação, irritação e saudade. Estou furiosa contigo! Mas, mesmo assim, não há um único dia em que não me pergunte se estás bem. Não há um único dia em que não olhe ansiosamente para o telemóvel à espera de notícias tuas: fazes-me falta, caramba. Fazem-me falta as tuas chamadas, as tuas palavras, as tuas mensagens tolas e doces ao mesmo tempo. Faz-me falta saber que existes na minha vida.

Depois de dois anos, perder-te dá-me uma sensação de vazio que não consigo explicar - mas não me deste alternativa. Passei semanas a tentar falar contigo, a tentar entender-te, a tentar ser paciente - mas, caramba, foram semanas e semanas sem resposta. Chamadas que nunca são atendidas, mensagens a apelar a que, pelo menos, me digas que estás bem, mas que nunca são retribuídas - não é justo, não faz sentido. Disse-te tantas, mas tantas vezes, ao longo destes dois anos, que nada me magoava mais do que o desprezo - não estava a brincar, Ricardo. 

E foi assim que acabei a despedir-me de ti - disseram-me uma vez que, se quisesse realmente ir embora, não diria nada. Ia e pronto. É verdade: tudo o que te disse foi, numa última tentativa, no auge do desespero, para te tentar fazer perceber que acabarias por me perder se não te deixasses de birras absurdas. Curiosamente, preferiste perder-me.

Apaguei tudo o que tinha de ti, tudo. Registos de chamadas, mensagens, fotografias, o número. Tudo o que me resta de ti são memórias que só o tempo tem o poder de apagar: quis garantir que nunca mais tentaria contactar-te. Que seria capaz de fazer contigo o que fizeste comigo: mas dói, dói para caraças. 

Dizer-te adeus era a última coisa que eu queria - se há pessoas boas, pessoas que eu acredito que vale a pena manter na minha vida, tu és uma delas. Ou és A Pessoa; sei que nunca te vou esquecer, a ti e a todas as coisas que me fizeste perceber sobre mim mesma: terias sido a pessoa certa, sim, mas nunca te esforçaste para o ser. E eu lamento isso, do fundo do coração - especialmente hoje que, no meio de um vale de lágrimas, me lembro do nosso início, tão bom, tão leve, tão simples - e sinto ainda mais a tua falta.  

quarta-feira, 5 de outubro de 2016

O meu problema é que eu continuo a não me achar merecedora das coisas boas - ainda estou aqui a achar que é muito bem feito que tenha acabado assim, que mereço cada lágrima que me cai compulsivamente dos olhos - eu e a minha mania de gostar das coisas, eu e o meu vício de acreditar na felicidade.

Eu nunca tive sorte: não nasci para viver contos de fadas e para ser feliz por aí. Já devia ter aprendido que tudo o que é bom tem um prazo de validade muito curto na minha vida.
E já devia saber que era exatamente assim que ia acabar.

e já arruinei tudo

Deveria existir um prémio nobel atribuído a pessoas que tivessem o dom de estragar tudo quanto lhes fizesse bem. 

Era a única forma que eu tinha de ganhar alguma coisa na vida.

terça-feira, 4 de outubro de 2016

dia sim dia não

Sentei-me à beira mar, a tremer de frio - de todos os lugares do mundo, este continua a ser o meu preferido nos dias em que não sei de mim. Como hoje.

Apetece-me perdir-te desculpa, uma e outra vez, todos os dias, por ser um poço de problemas, por não saber como ser tão leve e tão simples como tu, por não conseguir encarar os sentimentos de frente e deixar-me ir: a vida é um ir e vir, como as ondas deste mar que vêm e vão ao encontro dos meus pés, mas nunca chegam a tocar-me a alma, e eu temo isso em ti. Temo não suportar ver-te ir embora no dia em que perceberes que eu não valho o esforço.

O frio enregela-me os ossos: perco-me num casaco demasiado grande para mim. As mangas, compridas demais para os meus braços, deixam a descoberto as pontinhas dos meus dedos que procuram, ansiosamente, as tuas mãos para aquecer as minhas. Mas não estás: frio como outubro, gelado como a água do mar, permaneces demasiado longe para que eu te possa tocar. Tenho medo de ti na mesma medida em que te admiro: tudo em nós é contraditório e, quando ninguém está a ver, admito a mim mesma que temos tudo para acabar mal. Mas tento, ainda assim, que acabe bem.

Culpo-te um bocadinho mas apetece-me pedir-te desculpa logo a seguir. Sou má a confiar, em ti e em mim; olho-me ao espelho e tenho mais medo outra vez - medo de que os meus modos simples te envergonhem, medo de que te sintas embaraçado ao meu lado, medo de nunca ser suficientemente boa, inteligente, bonita. Medo de que percebas que eu não sou mais no mundo do que qualquer um destes grãos de areia que o vento arremessa contra mim. Medo de que percebas de que sou nada e que nada valho, embora me sinta tudo ao teu lado. Tenho medo de gostar de ti - medo de que o teu espírito livre e leve te arraste para longe de mim se algum dia eu gostar demais. E ainda não gosto?

Sentei-me aqui hoje porque não sabia de mim, e aqui continuo porque não sou capaz de me achar: tenho um milhão de perguntas na cabeça, um milhão de dúvidas que mal me deixam respirar. A vontade de te fugir só é equiparável à vontade que tenho de esquecer o mundo e de me perder nos teus braços: trouxeste-me a luz de volta, depois de meses e meses de trevas, e é exatamente isso que me faz temer-te tanto. Sinto que não me entendes, apesar de tudo. Sinto que ainda não percebeste a raíz das minhas inseguranças e o quanto eu preciso de alguém que me segure na mão e não largue até eu ganhar pé.

Desculpa, mas gosto de ti - e isso é quase como estar perdida, em alto mar, e nunca saber muito bem se me vais salvar ou se me vais afogar.
É por isso que não posso ficar.