domingo, 6 de novembro de 2016

sobre o que se perde

[perder alguém é como perder um pedaço de nós. como se nos dissessem que, daí em diante, há algo que sempre foi nosso mas com o qual nunca mais poderemos contar. é como se as nossas memórias deixassem de fazer sentido por não as conseguirmos enquadrar num tempo presente, por causarem dor todos os dias.
a morte é um lugar vazio na mesa e uma casa sem donos: é rasgar cinco folhas no calendário com a fúria de quem quer rasgar o tempo à procura de dias mais felizes, e continuar tudo igual, para sempre. é ver janelas fechadas, portas fechadas, escuro, silêncio, vazio. são as saudades de um par de olhos que nunca mais fitarão os nossos - é uma fuga até ao cemitério e uma conversa com uma lápide fria onde, algures, uns palmos mais abaixo, jazem os restos de uma das minhas pessoas preferidas: se me viu, lá de cima, riu-se com certeza. conhecendo-me desde sempre, nunca me poderia ter imaginado a fazer tal coisa: eu, a descrente, a desligada, a indiferente. fi-lo: sinto a falta de me sentar com ela à mesa, durante horas, em conversas intermináveis sobre nada de especial, sobre tudo, regadas com café e com amor.

fi-lo porque às vezes ainda me esqueço de que ela não vai voltar, e outras vezes não acredito.
fi-lo porque as saudades são tantas que já não cabem em mim - às vezes, transbordam.]

2 comentários:

Agridoce disse...

Um grande, grande abraço! E que continues a fazer o que te puder ajudar a aliviar essa dor...

ernesto disse...

Obrigada. Melhores dias virão :)