domingo, 31 de dezembro de 2017

um bom ano, criaturas!

Sabem o que vai mudar à meia noite? Absolutamente nada.
Aquelas gordurinhas localizadas - pelo corpo todo - vão continuar lá, o vosso emprego vai continuar a ser uma merda, aquela pessoa, a quem andam há séculos para dizer alguma coisa, vai continuar sem saber o que raio lhe querem dizer, aqueles desculpa e obrigada vão continuar presos nas vossas gargantazinhas regadas a álcool e marisco e, por este andar, só vão sair com uma manobra de heimlich. Pode ser que a fratura de duas ou três costelas sempre torne o início do ano mais emocionante.

Deixem-se de merdas que vocês não são a cinderela e não vai haver nenhuma transformação (ou 'destransformação') à meia noite. Se querem fazer, façam. Se querem dizer, digam. Não vão ter mais oportunidades amanhã, por ser o primeiro dia de um ano à estreia, do que têm hoje, neste ano velho e usado a dar as últimas por isso, por favor, entendam que as vossas vidinhas não vão mudar drasticamente se não fizerem algo por isso.

Sorte, saúde, paz e amor - são os desejos generalistas que temos para os outros e para nós, enquanto arrecadamos os sonhos debaixo das almofadas e nas gavetas mais perras: não façam isso. Concretizem-nos. Concretizem-se. O mundo precisa urgentemente de perder as gentes mal fodidas que não podem ver os outros bem.

Dos projetos que levo na mochila, recuso-me a falar, mas confesso-me ansiosa por saber o que se segue. Este foi um ano cheio de altos e baixos, com muitos momentos maus mas hoje, ao sentar-me aqui, consigo olhar para trás e sorrir: o que vivi de bom consegue neutralizar todos os dias em que me julguei no fundo do poço. E isso é o que de mais positivo levo deste ano: fui feliz. Cresci, aprendi muito, sobretudo sobre mim própria, mudei de ideias, mudei de planos, surpreendi-me bastante mas voltei a encontrar-me por aqui.

E aqui estou eu - de mangas arregaçadas e coração cheio. 2018 nem sonha com as coisas que lhe quero fazer.

sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

ele

É bonito. 
Não o tipo exageradamente bonito que é escolhido para fazer anúncios de shampõs e carros desportivos, mas bonito numa simplicidade sóbria que me embebece todos os dias. Está tão longe da perfeição quanto qualquer outro comum mortal, mas foi  o escolhido para protagonizar a minha vida a par comigo - e, volta e meia, ainda me questiono sobre como foi um gajo tão bonito olhar para mim.

É compreensivo. Tenta sempre entender os outros sem os julgar e nunca é mau - é, na realidade, muito melhor pessoa do que eu. Esforça-se por ver sempre o melhor lado de cada um, ainda que seja difícil.

Provavelmente, uma das pessoas mais desligadas dos bens materiais que eu conheço - prefere dar, sem receber em troca e, apesar de ser tão sovina quanto eu (quando deus faz uma panela...), está sempre atento, sempre a tentar perceber se preciso de alguma coisa, sempre pronto para me ajudar. E, apesar de ter trazido um orgulho filho da puta comigo do útero e me custar imenso deixar que ele me dê o que for, não posso senão admirá-lo. E gostar dele, cada vez mais.

Temos uma forma muito própria de sermos nós; não caprichamos no mel nem somos dados às celebrações banais. Somamos dias à história e histórias aos dias um do outro, todos os dias especiais, todos os dias com o mesmo sentido em nós, deixando que os meses se somem tranquilamente e em silêncio. Já lá vão uns quantos, mas nunca lhes damos ênfase, nunca escolhemos uma data oficial. Estranhos, nós. Estranhos felizes.

Somos diferentes, mas nunca tentámos deixar de o ser - às vezes concordamos um com o outro, outras vezes não. Discutimos também, volta e meia, quase sempre por assuntos triviais, quase sempre por querermos ser donos da razão até percebermos que não há uma razão universal e que tudo é relativo e variável. Nunca fomos demasiado parecidos, nunca quisemos sê-lo - caminhamos com as nossas diferenças, aprendemos a aceitá-las e encerramo-nos em abraços onde não resta espaço para dúvidas.

terça-feira, 26 de dezembro de 2017

o drama dos livros e dos escritores esquisitos

Um dos fenómenos que escapam o meu entendimento é o facto de eu ter uma lista gigante de livros para ler mas, ainda assim, insistir em reler: não me vou alongar sobre o harry potter e a quantidade  absurda de vezes que já li e reli a saga, mas ontem terminei, mais uma vez, o sexto livro. Guardei o sétimo para quando acabar os que trouxe da biblioteca, que já não tenho idade para andar com dois ou três ao mesmo tempo.

Na sexta, aproveitei a hora de almoço para uma fugidinha até à biblioteca mais próxima: de todas as opções disponíveis, peguei nas minhas velhas escolhas e resolvi que era altura para segundas oportunidades.

Minto: o ensaio sobre a cegueira não precisa de uma segunda oportunidade porque já é, indubitavelmente, um dos meus livros preferidos e, por isso mesmo, guardei-o para o fim tal como reservo o que mais gosto, no prato, para comer em último, por ser o sabor que quero preservar na boca.

Reli a metamorfose de um trago só: passaram uns anos desde o meu primeiro encontro com o kafka e, quando escrevi por aqui que não tinha gostado, aconselharam-me esperar uns anos e tentar outra vez. Foi o que fiz - sinto que tinham razão quanto à perceção que teria do livro, que o interpretei de uma forma bastante diferente e que me fez mais sentido desta vez, mas continuo a não conseguir dizer se gosto ou não.

Agora, entre o kafka e o saramago, ando aqui a debater-me com o antónio lobo antunes; tentei ler o eu hei de amar uma pedra há uns anos, mas desisti por não me entender com o tipo de escrita. Desta vez trouxe o que cavalos são aqueles que fazem sombra no mar?, e continuo a não perceber como é que alguém se queixa do saramago quando isto existe: estou determinada a não desistir, mas confesso que não consigo encontrar grande prazer em ler um livro confuso, cujo autor muda de assunto ainda mais rápida e bruscamente do que eu, e eu sempre achei que seria difícil alguém me ultrapassar nesse dom.

A ver vamos se não me chateio.

quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

o desapego, o tão falado desapego.

Se há coisa que eu não consigo compreender é a forma como o desapego se tornou numa moda, símbolo de superioridade e independência, como se fosse, de facto, uma coisa boa. Não me refiro, obviamente, ao desapego material, mas sim ao desapego das pessoas pelas pessoas.

Há já anos que lhe fui apresentada, sem cerimónias, num dia em que a minha vida foi virada do avesso e o mundo passou a girar ao contrário; nunca temos realmente a noção do quanto os nossos gestos podem marcar alguém, e estou mais ou menos certa de que, quem causou esta mudança em mim, nunca julgou estar a deixar-me marcas tão profundas e difíceis de sarar.

Nos últimos sete anos, poucas, pouquíssimas, foram as pessoas em quem consegui confiar, e menos ainda aquelas que conseguiram uma posição na minha vida que fizesse realmente a diferença a ponto de não me imaginar sem elas. Assim, de repente, só me lembro de duas pessoas - com uma delas já não tenho qualquer tipo de relação, e a outra é o monsieur. 

Isto não é motivo de orgulho para mim, é meio triste e medianamente sufocante - não é por não querer, é mesmo por não conseguir. Se sinto falta de uma amizade forte, além do meu rapaz que, antes de namorado, é o meu melhor amigo? Claro que sim. Mas tenho constatado, com alguma pena, que o afastamento de algumas pessoas que, até há bem pouco tempo, faziam parte do meu dia a dia, não me pesa. Não me custa. Não me causa qualquer mossa nem me faz querer tentar recuperar a ténue amizade perdida. Pura e simplesmente, não quero saber - e não sou pessoa de fingir. Ou bem que gosto, ou não há mesmo nada a fazer.

Contudo, não vejo algo de bom nisto e continuo a não conseguir entender porque raio alguém poderia almejar tornar-se desapegado. Tenham cuidado com o que desejam - este lado do mundo não é tão fixe quanto possam pensar.

terça-feira, 19 de dezembro de 2017

lontras will be lontras

Uma vez que não gosto de doces de natal, há uns anos comecei uma tradição muito minha que consiste, essencialmente, em fazer uma mousse de oreo, que deixa uma pessoa diabética só de olhar, por forma a compensar-me por todo o colesterol típico da época que eu não vou ter. E a gordinha vai feliz mesmo.

A questão é que eu me esqueci deste pormenor; por algum motivo, não me ocorreu que se aproximava a passos largos a noite da consoada, que para mim é mais a noite da consolada. Tendo em conta que reservo o meu direito a comer esta mousse duas vezes no ano e, por acaso, este ano também me esqueci de a fazer no meu aniversário, parece-me que tenho direito a uma dose dupla, e juro que fiquei num ponto de felicidade quase a roçar o orgasmo quando me lembrei de que daqui a uma semana vou estar a chafurdar numa taça gigante de mousse de oreo. Sem culpas, porque a balança foi passar o natal com a família.

(ou então não, que aqui a pessoa até pode não andar a fazer grande coisa para perder peso, mas já começa a ponderar cortar os pulsos, ou um naco de gordura das ancas, se engorda cem gramitas.)

segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

um dos melhores filmes de terror de sempre

Se eu gosto de ir às compras? Odeio.
Aquele veste-despe, estas calças comprimem-me o nalguedo, estas deixam-me as mamas ao pé da boca, estas não passam do tornozelo, esta camisola não me chega a tapar o soutien e esta não deixa respirar, enerva-me. Pior ainda quando uma pessoa tem de sair do provador, com trezentas peças de roupa penduradas nos bracitos, e faz aquele walk of shame até à funcionária (ou, pior, funcionário), entrega tudo e diz é para deixar, não cabe.

*introduzir música triste e muitas lágrimas*

Depois há a outra parte, que é a parte gira, e consiste, basicamente, em deambular pelos corredores da loja, olhar para todo o lado à procura de algo que seja exatamente aquilo que nós queremos. Simples, não é?

Não. Especialmente se estiverem acompanhadas por um macho. Eles são demasiado objetivos e acreditam piamente que temos a capacidade de os imitar nessa façanha. Volta e meia olho para ele e vejo-o a respirar fundo, antes de dizer: patrícia, pára e pensa: o que é que tu queres?, e uma pessoa fica ali, meio desorientada, e sem saber como lhe explicar que isto não funciona assim connosco. Não vai dar.

A nossa arte é mais a de correr a loja toda à procura de algo que nos agrade, dizer, aproximadamente, cinco mil vezes olha que giro... se fosse rica levava, mas não ou gastar dinheiro com isto porque nem preciso assim tanto desta merda, e sair daquele antro do pecado, sete horas depois, sem ter comprado nada e a resmungar que não há nada de jeito.

E fazê-los perceber isto? Oh oh.

[no fundo, no que toca a querer fugir da loja e especialmente quando está cheia de gente, sou igual ou pior do que ele, e não, nem sou moça de demorar assim taaaanto numa loja, mas shhhh]

sábado, 16 de dezembro de 2017

eu, patrícia.

As pessoas mais perigosas são as cheias de certezas absolutas, que pensam que o mundo é um tabuleiro de xadrez onde tudo é desenhado ao milímetro para ser preto e branco, sem falhas, sem misturas, sem milhares de nuances em tons de cinzento que não sabíamos existir. Só que não.

Não acontece tudo como planeado - às vezes, porque não dá. Outras vezes, porque percebemos, a meio do caminho rigorosamente traçado em linha reta, que seríamos mais felizes com uma curva. E não há nada de errado nisso.

É um erro desenhar a vida a régua e esquadro e achar que seguir o tracejado é o caminho para a felicidade. Desculpem: as coisas mudam mesmo. Nós mudamos. Perseguir o que julgávamos ser certo aos quinze anos, e que nos habituámos a tratar como se do nosso maior sonho se tratasse, pode mesmo destruir-nos. Notem que não vos estou a dizer que é errado tentarem concretizar os vossos sonhos, o que é errado é julgá-los imutáveis e não se permitirem a mudar de ideias, nem quando surge a ténue sensação de que não é bem por ali que querem ir.

Eu também achava que me conhecia e sabia tudo sobre mim, mas não sei. Este foi o ano das grandes descobertas, em que quase olhei para mim mesma como uma estranha. Em muito do tempo, não me consegui reconhecer; foi o ano em que me perdi, em que me senti à deriva e, depois, em percebi que houve um motivo para a minha história se ter desenrolado desta forma, e que todo o tempo que eu julguei perdido, me fez ganhar bastante. 

Este ano concretizei um dos meus sonhos de infância. E, posso dizer-vos, tornou-se rapidamente num pesadelo: as circunstâncias da minha vida alteraram-se drasticamente e, com elas, tudo aquilo que eu sempre julguei ser o melhor para mim. Desisti - não de um sonho, mas da ideia que tinha dele. Mudei de via, mudei de ideias, mudei os planos. Ou vou sem grandes planos, por agora. O único plano é estar feliz, onde quer que esteja.

E depois?
Depois logo se vê.

sexta-feira, 15 de dezembro de 2017

my manic and i

Foi há um ano: encontrei-te na estação e levei-te ao meu sítio favorito. Avisei-te, com antecedência, de que não sou pessoa de barzinhos fancy ou esplanadas dignas de fotografias. Sou mais uma filha do mar, com toda a reverência e respeito que lhe guardo, e nunca me poderia apresentar de melhor forma do que num passeio pela praia, no frio de dezembro. Calhou bem: gostas do frio e partilhas do meu amor pelo mar.

Andámos pelo meio das pegadas de gaivota, falámos de tudo e calámo-nos. Sentimos as gotas de chuva a engrossarem e a enregelarem-nos até aos ossos. Pediste autorização para me abraçar, com o intuito de me aquecer, e nunca mais me largaste.

Foi há um ano que senti os teus lábios pousados na minha testa, o teu corpo contra o meu, a minha vida a par com a tua, pela primeira vez. Por esses dias já me obrigava a assumir, ainda que contrariada, que me tinhas furado os planos e feito tropeçar de amores por ti. Logo quando eu nem me queria apaixonar.

Um ano depois, esses dois na praia não parecemos nós, tu e eu, a tocarmo-nos a medo e sem fazer a mais pequena ideia de onde aquele primeiro passo nos iria levar, nem que teríamos ainda uns meses e muitas lágrimas a separar-nos do dia em que se sararam todos os medos, todas as inseguranças, e nos tornámos num par.

Demos mais de mil voltas às voltas que a vida nos tem tentado dar a nós- somos bons nisto. A contrariar as expectativas, a arrumar com as probabilidades. Obrigada por esta maravilhosa aventura. Louca, mas maravilhosa.

quinta-feira, 14 de dezembro de 2017

as feministas, o sexo e o bacalhau

Contra o movimento feminista, tenho absolutamente nada. O que me enerva realmente é que este acabe por ser representado por gajas raivosas, que nos saltam para o caminho, em protesto, denegrindo e ridicularizando um movimento que tinha tudo para ser benéfico. Acalmem lá o pito!

As mulheres não são santas, desculpem. Não são pepitas e ouro, não são puros diamantes incompreendidos; são seres humanos, tão falíveis quanto o resto dos comuns mortais. Desculpem, mais uma vez, se se esqueceram disso algures durante o processo de beatificação de tudo quanto é portador de uma vagina.

Curiosamente, este grupo de criaturas iluminadas que tanto quer exaltar as mulheres como sendo seres superiores, começa por a inferiorizar tanto quanto pode; a mulher é sempre a coitadinha que precisa de trinta e sete gajas de mamas empinadas a dizer-lhe que é linda, poderosa, a maior, a melhor. É uma matemática curiosa esta: na luta pela igualdade de direitos, começam por reduzir o valor da mulher a pó só para, logo em seguida, mostrarem que ela é bem melhor do que o homem. A igualdade fica perdida algures entre a síndrome da coitadinha e o auge da presunção. Não entendo. A minha vagina deve ter vindo com defeito de fabrico e eu nunca notei.

Escrevo isto porque me surgem no feed do facebook, com maior frequência do que seria desejável, sabe deus porquê, publicações feitas por uma iluminada cuja página fala, essencialmente, mal dos homens e de sexo. Sobre como adora foder, sobre como poucos são os homens que sabem fazer um minete, sobre como adora fazer um bom broche - e não, esta não é a minha escolha de palavras habitual. Escusado será dizer que isto me parece uma velha saudosista a relembrar as memórias da juventude, porque, claramente, é falta de sexo.

Quando alguém reclama do conteúdo, a mulher, que é mal educada que dói, alega sempre que já lá vai o tempo em que a mulher tinha de permanecer calada e que tem todo o direito de falar de sexo, se lhe apetecer. E tem, mas vamos lá ver a coerência da coisa: querem colocar-se ao mesmo nível de qualquer homem mas, se as mesmas publicações fossem feitas por um macho, este seria um porco nojento que não tinha nada que andar a falar sobre essas coisas em público, e era o deus me livre.

Vejamos: eu gosto de bacalhau, adoro bacalhau. Bacalhau com natas, bacalhau à Brás, bacalhau com broa, bacalhau no forno, bacalhau à Gomes Sá - mas não é porque eu adoro bacalhau e me sinto livre para falar disso que vou passar a vida a chatear as pessoas com as minhas preferências na hora de comer bacalhau. Ou sobre como sou feliz quando alguém me faz um bacalhau com natas mesmo bom. Ou sobre como acredito que faço o melhor bacalhau com broa do mundo. Estão a ver? Era chato se eu vos dissesse isto todos os dias. O sexo é igual ao bacalhau. 

Não há nada de errado em gostar de sexo, nem tão pouco em falar-se de sexo. Mas limitar toda e qualquer conversa a esse tema porque agora as mulheres soltaram a franga e acham que essa é a melhor forma de se afirmarem, estraga tudo. Podem ser pessoas interessantes sem contarem ao mundo o que é que mais gostam na cama. Não têm de se deixar chegar a pontos ridículos para mostrar que uma mulher pode falar do que quiser. Não sejam badalhocas.

quarta-feira, 13 de dezembro de 2017

essa coisa dos beijinhos e dos abraços

Vamos começar pelo ponto fulcral da coisa: eu nunca gostei de beijinhos, e não há nada a fazer quanto a isso. Essa coisa de andar por aí a espalhar encostos de bochecha ou, mais dramático ainda, haver aquele contacto lábios-bochecha, não é para mim. Especialmente quando eu nem tenho assim tanta confiança com o ser humano que se propõe a invadir o meu espaço pessoal.

Por mim, cumprimentávamo-nos todos com um olá e um sorrisinho afetado ou, no máximo, um aperto de mão à homem do tasco. Deveria haver um protocolo que estabelecesse o número de horas mínimo de convivência para que se passasse à próxima fase.

Isto chegou a acontecer-me numa entrevista de emprego; mal entrei na sala, a mulher apanhou-me desprevenida e espetou-me as beiças na bochecha, sem pedir licença, e eu sem fazer a mais pequena ideia de que já estávamos nesse ponto da relação. Entretanto, não fiquei minimamente convencida com o que me disse em relação ao emprego e, à saída, quando se preparou para repetir a proeza, estiquei a mãozinha e apertei-lhe o bacalhau. Espero, pelo menos, ter-lhe ensinado alguma coisa.

E os abraços?
Se, por um lado, dar beijinhos a (alguns) familiares ou quaisquer outras pessoas com quem mantenha uma relação mais próxima, é na boa, abraçar-me é um direito exclusivo do monsieur. Qualquer outra pessoa que me tente agarrar, por melhor que seja a intenção, é só estranho. Eu não ando assim a encostar as mamas ao peito de qualquer um. Este é, definitivamente, o meu lado mais gato: se eu quiser festinhas e miminhos, tudo bem. Se não estiver para lá virada, é melhor nem chegarem perto, caso contrário... caso contrário, vou ter de fingir que está tudo bem porque não posso eriçar o pelo e espetar-vos as unhas na cara. É pena.

terça-feira, 12 de dezembro de 2017

a saga das entrevistas: cinderela e o público

Com o meu currículo à frente, onde estava explícito que trabalhei num hospital e descritas algumas das minhas funções, que envolviam cuidados ao utente, pergunta-me:

- mas nunca lidaste com o público, pois não?*

...
...
...


Acredito que o meu choque face a esta pergunta não seja compreendido por muitos de vós mas, não querendo puxar a brasa à minha sardinha, parece-me que trabalhar num hospital seja o teste mais violento à nossa resistência e capacidade de lidar com o público. Há doentes que são uns doces, mas também os há bem filhos da puta - geralmente, esses são os que ficam por lá mais tempo, a tentar enlouquecer os mais variados profissionais de saúde. E sim, há que ser simpático e prestável, mesmo com aqueles que nos tiram do sério e estão, claramente, a gozar com as nossas caras.

Quem aguenta aturar um paciente que nos maltrata durante meses, meus caros, aguenta qualquer guerrinha momentânea em qualquer outro tipo de emprego.

segunda-feira, 11 de dezembro de 2017

nu e cru

Foi numa terça feira, e eu estava doente. Contra a vontade da minha mãe, que me disse que seria melhor não ir às aulas, resolvi que iria mais tarde. E fui. Ou tentei ir.

Tinha chovido mais cedo.
Por essa altura, conduzia já há mais de dois anos, e estava mais do que habituada àquele percurso. Era o meu caminho de todos os dias mas, naquele em específico, tinha uma surpresa reservada para mim.

Aconteceu tudo muito rápido, e eu não tenho uma explicação: de um momento para o outro, perdi o controlo do carro e essa, posso jurar-vos, continua a ser a sensação mais aflitiva que algum dia tive na minha vida, e que ainda hoje é capaz de me deixar com o coração acelerado. Por mais que tentasse, o carro não me obedecia, não ia para onde eu queria. E, depois disso, o vazio.

Na recordação seguinte, estou descalça, na estrada. Tenho vários homens à minha volta, e eu não sei porquê. Estou confusa e assustada, as minhas botas estão no chão e dói-me muito a cabeça. Sinto uma pressão enorme do lado esquerdo e vejo tudo baço, como se fosse desmaiar. Pedi-lhes que ligassem à minha avó; disse-lhe que tinha tido um acidente, e depois fiz reset na memória: esqueci-me do acidente e do telefonema.

Mais tarde, estava dentro da ambulância a perguntar o que me tinha acontecido. Descobri três dias depois que estava em hipotermia, embora não me lembre de ter tido frio. Nem sequer me dei conta de que estava encharcada dos pés à cabeça, coberta de lama, com rastas no cabelo, até ter chegado ao hospital.

Tudo o que sei, foi-me contado mais tarde: havia uma óleo e lama na estrada molhada, o que foi a junção perfeita para que me despistasse na curva onde tantos e tantos outros se têm despistado. Mas não acontece só aos outros.

Capotei e caí num campo de arroz - o carro só parou quatro voltas mais tarde, e acreditem que é aterrador imaginar que a primeira foi de frente. Estive sempre consciente, apesar de o meu cérebro ter decidido que não valia a pena guardar essa informação - mal o carro se cansou de rebolar na lama, eu saí, calmamente, pelo meu próprio pé. Tudo o que era meu estava espalhado na lama, o meu computador debaixo do carro, a minha coragem estilhaçada como os vidros.

Saí ilesa. 
Meia dúzia de escoriações, vários hematomas, um braço com o dobro da grossura, uma dor de cabeça que não me deixava dormir e tonturas horríveis que só passaram um mês depois, mas estava bem. O carro faleceu ali mesmo; só tive coragem de o ver algum tempo depois, e não vos consigo descrever a sensação de o ver completamente destruído, saber que estava dentro dele quando aconteceu, e não me lembrar de nada. Zero. Deixem-me que reforce que o meu anjo da guarda é mais fixe do que os vossos.

Passou mais de um ano.
Na verdade, vai quase em dois mas pesa-me menos na consciência se não assumir para mim mesma que já era mais do que tempo de ter arrumado este assunto, de não o reviver de cada vez que conduzo, de não pensar nisto todos os dias. Mas é o que acontece. Não consigo evitá-lo.

Se o escrevo hoje, é porque este episódio continua a ser o elefante no meio da sala. É porque, por mais que tente, não consigo ultrapassar isto: todo este tempo depois, eu continuo com um medo absurdo de conduzir - e, mais ainda, de andar com qualquer outra pessoa a conduzir. A sensação de que não posso controlar o que acontece dá cabo de mim, muito embora - se culpados houver - eu tenha sido a única culpada do que me aconteceu. Mas não consigo.

Quase dois anos depois, eu ainda fico ansiosa em curvas, ainda me assusto se o vento me abana o carro e eu temo estar a perder o controlo, ainda acho que vou ter um acidente a qualquer momento. Imagino-o a toda a hora, para vos ser franca: vejo cada carro como uma ameaça, tenho crises de ansiedade em situações que deveriam ser naturais. Isto consome-me, de uma forma que não cabe em palavras e, na maior parte do tempo, sinto-me só ridícula por isto: caramba, há quem tenha acidentes bem piores, e na verdade eu nem sequer me lembro da pior parte. Como é possível não conseguir esquecer? 

Passaram-se quase dois anos, mas eu ainda hoje sonho com despistes.

quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

a saga das entrevistas: cinderela inexperiente

Lembro-me de ter entregue o currículo numa loja de roupa, que estava a precisar de uma funcionária, e a rapariga ter dito mas não tens experiência na área, com ar de quem tinha pena de mim. Claro que nunca cheguei sequer a ser chamada para uma entrevista. Não tinha experiência.

Na verdade, eu nem estava assim tão interessada naquela vaga em específico, mas a verdade é que isto é comum à maior parte das vagas de emprego. Ninguém parece disposto a dar a oportunidade de alguém mostrar que pode ser tão bom, ou melhor funcionário ainda, do que outro com mais experiência. Porque pode, meus caros, e o que não falta por aí é gente irresponsável com bons trabalhos.

Acho absolutamente incrível que as pessoas tenham tanta facilidade em esquecer-se de onde vêm. Todos, absolutamente todos, desde a empregada doméstica ao médico, desde o pedreiro ao arquiteto, por mais que tenham graus de formação bastante diferentes, tiveram de começar do 0. Sem experiência - não sei se estarei a dar uma novidade a alguém. Talvez andem por aí boas almas convencidas de que já se nasce doutor.

Curiosamente, acabei num sítio onde o que tive de aprender foi bastante mais complexo do que dobrar camisolas e separar calças por cores. E aprendi rápido, vejam só! Não me fecharam a porta por terem de me ensinar tudo do zero, ainda que não fosse coisa que se aprendesse num dia. Deram-se ao trabalho de apostar em mim pela pessoa que mostrei ser na entrevista, e não pelo currículo.

Contudo, infelizmente, pessoas assim são cada vez mais raras.

terça-feira, 5 de dezembro de 2017

a primeira vez nunca se esquece

Comecei por ouvir gritos na rua. Inicialmente, pensei que se tratava de um casal e já estava a preparar-me para erguer o punho contra a violência doméstica, quiçá mostrar as mamas no meio da rua por nenhum motivo em especial, mas porque sou mulher e as mulheres tudo podem.

Para minha grande desilusão, eram mesmo dois homens, mas lá calha que um ainda consegue ter mais voz de pita do que eu, e olhem que é bem difícil.

Estava um senhor franzino, com idade para ser meu avô, a agarrar pelo colarinho um homem mais jovem que poderia, facilmente, ter arrumado o outro ao canto com um sopro, mas que perdia toda a credibilidade de cada vez que abria a boca e parecia uma maria amélia. Aparentemente, a maria amélia tinha entrado em casa do homem e tinha-lhe roubado dinheiro. Muito dinheiro.

Ali, do outro lado da estrada, a situação era tão ridícula que chegava a parecer encenada. A pobre maria amélia só dizia que não tinha roubado o que quer que fosse, e o velho oscilava entre propostas eróticas e violentas; num momento gritava "se sais daqui, fodo-te todo", para no momento seguinte gritar "eu mato-te!".

Tendo isto acontecido à porta de um café, seria de esperar que alguém defendesse a criatura. Contudo, as pessoas apressaram-se a entrar e a fazer de conta de que não estava a acontecer - ainda houve um senhor que, entre baforadas, foi dizendo ao velho para não bater ao outro, mas acabou por desistir e ir embora de bicicleta.

Cansado de segurar a amélia pelo colarinho, obrigou-o a sentar-se numa cadeira, senão fodia-o todo, enquanto fumava.

Portanto, depois de alguma hesitação, peguei no telemóvel e... não, não comecei a filmar para postar em tudo quanto é rede social, apesar de ser uma alternativa mais engraçada ao circo de natal. Resolvi fazer alguma coisa para acabar com aquilo e liguei à GNR (sejam todos cinderela, fáxabor!).

Expliquei atabalhoadamente onde estava, porque o meu sentido de orientação ainda hoje está a jogar à bisca com a minha beleza, lá no útero da minha mãezinha, e eu não faço a mais pequena ideia do nome da rua onde passo os meus dias. Ups.

Não percebi o que aconteceu, mas a maria amélia conseguiu esquivar-se para dentro do café e o outro ficou cá fora a olhar para a porta. Imagino que o pobre tenha ido chorar para a casa de banho, mas são só suposições.

Fiquei a pensar que tinha ido inquietar a GNR para nada, até que eles chegam. Não um, mas dois carros da GNR. Não pude conter uma gargalhada e pensar que talvez devesse ter sido mais específica nos desacatos à porta de um café. Mas depois eles saíram dos carros e eu percebi que foi deus nosso senhor quem mandou um par extra para me animar a vista. Bem podem andar à pancada no café todos os dias, que eu estou completamente disponível para ligar para a GNR as vezes que forem necessárias. E, se for preciso, até me entrego de boa vontade.

Quanto aos outros dois, falaram com os agentes e acalmaram os ânimos. Ninguém soube que tinha sido eu a ligar.

(se soubessem, acredito que o mulherio residente me começasse a idolatrar, e eu nem tenho a letra bonita para dar autografos)

a saga das entrevistas: de cinderela a escrava

Infelizmente, esta não teve tanta piada quanto a primeira, mas também me parece importante que se fale destas coisas.

Escassos dias depois da tal entrevista, recebi outra chamada. Vi-me e desejei-me só para descobrir quem era, porque a qualidade da ligação estava ali ao mesmo nível da minha beleza, e porque tudo quanto é recrutador neste país acredita piamente que uma pessoa à procura de emprego se candidata a uma única vaga, numa única empresa, e fica três meses à espera de obter resposta antes de partir para outra. Portanto, não vê a necessidade de se identificar convenientemente e explicar a que raio de vaga se refere; nós adivinhamos.

Procurei, pelo pouco que tinha conseguido perceber, por entre os meus emails enviados e acabei por me aperceber de uma coisa curiosa: no espaço de, exatamente, um mês, eu tinha-me candidatado duas vezes à mesma vaga, na mesma empresa, mas com referências diferentes. Achei estranho, mas não tinha nada a perder, e podia ser algo interessante.

Chegada ao local, converso com um casal. Descobri mais tarde, e porque sou uma stalker competente, que são marido e mulher - contudo, não se deram sequer ao trabalho de se apresentar na entrevista e eu descobri os nomes deles através do facebook.

Algo não estava a bater certo.
Candidatei-me àquela vaga porque, apesar de não ter formação na área nem ter experiência, preenchia os requisitos mínimos. Acredito mesmo que poderia ter tido aquele trabalho, uma vez que envolvia, em grande parte, escrever, e não era exigido mais do que o 12º ano. Contudo, a entrevista foi conduzida por forma a diminuir-me ao máximo, realçando a minha inexperiência a cada 30 segundos, referindo que tinha poucos estudos, que estavam a correr um grande risco ao apostar em mim.

Tudo certo até aqui. Ou mais ou menos, mas a questão da inexperiência dá todo um outro post.
O que começou por me parecer mesmo muito estranho foi a incoerência: rebaixavam-me como se eu fosse acéfala e tivesse passado os últimos 22 anos a viver numa gruta, mas pareciam mais desesperados para que eu aceitasse ficar com o emprego do que eu estava por o aceitar. Chegaram a referir que tinham mais uma entrevista a seguir, mas não colocavam sequer a hipótese de gostarem mais do outro candidato; o lugar era meu, bastava eu querer.

E porquê?, perguntam vocês.
A ideia era fazer um estágio profissional. Honestamente, isso não me incomoda; por ser uma área interessante e bem diferente daquela em que tenho formação, acredito que seria bom para mim. O problema é que, e dada a minha inexperiência, poucos estudos e tudo e tudo, a sugestão deles seria que eu passasse um mês à experiência, até eles pedirem o estágio profissional. Isso, sem receber. Um mês, diziam eles, até que o estágio profissional fosse aprovado. 

Por não gostar de fechar portas sem ter a certeza, disse-lhes que responderia mais tarde, alegando que precisava de conversar com os meus pais, uma vez que passar um mês a deslocar-me para o local teria custos, e aceitar não ser remunerada não era uma decisão que eu pudesse tomar de cabeça quente.

Eu sabia que o processo de aprovação dos estágios profissionais era lento, beeeem lento, mas resolvi dar o benefício da dúvida e informar-me com quem de direito. No centro de emprego, foi-me dito que agora os estágios só podem ser pedidos entre 15 de novembro e 31 de dezembro, e que só após o término desse prazo é que estes começam a ser avaliados. Ou seja, contas bem feitas, e já que eles não pensavam pagar-me até que o IEFP aprovasse o estágio e, sendo otimista, talvez começasse a receber alguma coisa pelo meu trabalho lá para fevereiro ou março. 

Posto isto, e porque eu sou uma pessoa de palavra, enviei-lhes um email a explicar que tinha resolvido informar-me e que, apesar de não ser uma entendida no assunto, até porque não tenho muita experiência nem muitos estudos, a minha sugestão, já que tinham tanta urgência em encontrar uma pessoa para o lugar, passaria por experimentarem pagar a alguém para trabalhar para eles.

Despedi-me desejando-lhes a melhor das sortes na busca de alguém disposto a trabalhar para aquecer; responderam-me, novamente, com os ataques subtis da entrevista, que não era nada assim, que nunca foi dito que não me pagariam após esse mês de experiência - o que é verdade. Decidiram dar a entender que o estágio seria aprovado quase imediatamente. Acabaram a resposta com a brilhante conclusão de que tinham ponderado correr o risco de apostar em mim, mas eu tinha perdido todas as hipóteses ao redigir aquele email em tom jocoso.

Como se eu quisesse ter a mínima hipótese numa empresa que faz de um trabalho, com um nível de complexidade mínimo para qualquer pessoa que saiba ler e escrever um bicho papão, ao ponto de ter de trabalhar um mês à borla. For sure.

Agora lamento não me ter ocorrido concluir a resposta com chave de ouro; acredito que aquele email tenha dito o suficiente acerca da minha perspicácia e proatividade. E, vejam só, não demorei um mês a escrevê-lo.

segunda-feira, 4 de dezembro de 2017

a saga das entrevistas: de cinderela a barbie

Há uns meses, tive uma entrevista de emprego num local onde eu sabia de antemão que iria trabalhar rodeada de homens. Isso não me desagradou, bem pelo contrário, porque - a verdade tem de ser dita -, as mulheres são quase sempre umas cabras umas para as outras e eu não sou a pessoa com mais pachorra neste mundo para aturar os mexericos desnecessários. Uma pessoa fica cansada só de tentar acompanhar o jornal do maldizer.

Posto isto, lá estava eu, ainda antes da hora marcada, sentada numa cadeira confortável à espera de que o senhor chegasse. E nervosa, claro está. Bem vestida, como se quer numa entrevista de emprego, ainda que simples - com uma camisola do lidl - e maquilhada como em todos os outros dias em que me apetece maquilhar: base, sombra castanha, eyeliner e rímel, no more, no less. E esta informação só me parece relevante porque, de facto, não quero que imaginem uma boneca de cera deste lado, para o que se passou a seguir.

Os minutos passavam e eu continuava a não entender muito bem o que se estava a passar. As pessoas - tudo macho, quase todos jovens - iam passando por lá, mas eu não fazia a mais pequena ideia de quem era quem e por quem deveria aguardar. 

Entretanto, passa um senhor com idade para ser meu avô; pensei que seria O Tal. Sorri quando o jovem simpático, e giro, da receção lhe diz que eu estou para a entrevista. O ansião comenta:

- Ah, não, não pode ser. Eu estou velho e o meu coração está fraco, não me podem meter aqui estas coisas lindas, senão acabam comigo.

Tudo bem. 
A pessoa lida mal com elogios, mas não é de vidro. Eu sei que isto já era capaz de fazer saltar umas quantas Capazes para o caminho, a gritar assédio e porco nojento, mas até achei piada na altura.

Mais tarde, finalmente, chega um casal que se dirige a mim: eram eles, os recrutadores. Depois de ter deixado o nervosismo a fermentar durante um século e meio, estava no ponto. Mal se tinham apresentado, o senhor voltou. Repetiu a ladainha, dizendo que coisas lindas acabam com ele e acrescenta:

- Os rapazes iam ficar todos excitados. O que talvez fosse bom, trabalhavam mais, não sei...

Para aumentar o meu nível de conforto, o recrutador decide responder, como se eu não estivesse a ouvir, e diz:

- Barbies há muitas. Vamos ver o que ela sabe fazer.

Não fiquei com o trabalho, mas nunca cheguei a descobrir se por não ser uma barbie competente ou por, na entrevista, ter sido sincera quanto a algumas das condições não me serem, de todo, convenientes. Para vos ser franca, não posso dizer que fiquei triste por não ter sido a escolhida. Muito menos agora que, ao recordar a situação, me apercebi de que esta entrevista poderia muito bem ser para um lugar na indústria pornográfica.

(nada temam, seres desse lado, que esta pessoa trabalha vestida e as únicas câmeras são as de vigilância)