Há sempre uma crença irracional de que alguém vai aparecer no último segundo para nos salvar e, sem entendermos porquê, damos por nós a caminhar lentamente e a espreitar para cima do ombro enquanto nos encaminhamos para onde, no fundo, não queremos ir. Podem dizer-me que isto é culpa de todos os filmes que vi, de todos os livros que li - é, não nego. Mas querem o quê? Não me podem culpar por querer escrever a história da minha vida.
Fi-lo hoje. Enquanto me encaminhava para a porta do autocarro, esperei sem esperar que alguém me detivesse. Esperei que alguém fosse sentir a minha falta e se sentisse tão dilacerado quanto eu. Tal como o previsto, não apareceu ninguém - quando dei por mim, estava a chorar. Tinha consciência de tudo o que se tinha acabado de perder, de tudo o que não voltaria mais. De todas as respostas que não chegaram, de todas as perguntas que ficaram por fazer. Em cinco segundos, só restava o silêncio e a dúvida.
Talvez a culpa tenha sido minha, talvez não. A minha felicidade sempre esteve contida nas coisas mais simples do mundo - sinto-o agora, de pés descalços no chão frio do terraço molhado -, a minha esperança sempre esteve guardada num recanto que não mostro a ninguém. Talvez resulte, talvez não. Há um mês, dizia eu que, apesar de tudo o que se passava e de todas as razões que tinha para cair de joelhos e me entregar ao desespero, entendi que não valia a pena fazê-lo naquela altura. Ainda haveriam de vir coisas boas e coisas más - tinha tempo para chorar no fim. Hoje chorei. Talvez pelo fim, talvez não. Não estou tão perdida quanto antes, nem tão certa quanto estava ontem. A verdade é que quase tudo é uma incógnita para mim, e as coisas que desconheço são, invariavelmente, as que mais me doem por as inventar como quero ver, de forma a não criar ilusões, a fugir à esperança. Sempre tive medo de ser feliz. Acho que, no fundo, sempre acreditei que não merecia.
Hoje, morreu-me algo. Soube-o mal pus um pé no primeiro degrau; tinha acabado. O que quer que fosse que existia antes, tinha acabado de desaparecer de uma vez para sempre - e eu não fiz nada para o impedir. Talvez quisesse, talvez não. Deixei-me dominar pelo cansaço, pelo medo, pelo orgulho, e perdi tudo sem oferecer resistência. Não estou bem com isso. Estou, aliás, mesmo muito mal - não lido bem com despedidas, não lido bem com perdas, e o que perdi hoje é absolutamente irrecuperável. Posso viver melhor, posso viver pior - mas nada será igual ao que perdi.
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