segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

este não é um texto infeliz

Talvez eu não seja o amor da tua vida.
Cresci a acreditar nas coisas horríveis que diziam a meu respeito. Esforcei-me por aprender de cor todas as lições que saiam da boca dos outros, fiz os possíveis para me convencer de que era uma ousadia fingir ser normal quando, logo após a minha conceção, houve um grupo de genes que decidiram condenar-me ao abismo da diferença. O mundo era uma peça de roupa que não me assentava bem no corpo porque eu não lhe pertencia. De alguma forma, achei-me inferior a minha vida toda.

A mulher que sou hoje é um baú cheio de recordações amargas colecionadas durante os anos de escola - ensinaram-me que eu não valia nada por ser diferente, porque seria sempre a mais feia, a mais anormal, e eu decidi esquecer-me da minha própria existência para parar de desejar não existir. Mas sabes? Eu não sou assim tão má.

Não sou bonita, mas há mulheres mais feias. Também não sou magra, mas já fui muito mais gorda. Posso não ser a mais inteligente de todas, mas não sou assim tão burra. Abuso mais no sorriso do que na maquilhagem, e sou difícil de conquistar mas, posso garantir, quando gosto, gosto com cada átomo do meu corpo.

Decoro-te com o prazer de quem decora a letra da sua música preferida, e escrevo sobre ti com paixão como se me sentisse capaz de te amar para sempre, mesmo que não acredite que passemos de amanhã. Mesmo que o que sinto não passe de um sopro bom, capaz de me acelerar o coração, garanto, trato-te como se fosse um furacão inteiro. Porque sou intensa e entrego-me ao que sinto de corpo e alma.

Tenho mil e um defeitos; às vezes falo demasiado alto e outras rio-me tão descontroladamente que ronco. Não tenho jeito nenhum para arranjar as unhas e andam sempre pitadas que mete dó. Nunca te contei, mas se calhar tenho mais barba do que alguns dos teus amigos: estão sempre a crescer-me dois ou três pêlos pretos no queixo e tenho de me livrar deles com a pinça. Lavo o cabelo dia sim dia não, mas se não for sair de casa sou menina para saltar o dia de lhe espetar com champô, amaciador, máscara, mais um creme esquisito para regenerar pontas e um sérum quando o estico mais um spray sabe deus para quê - porque chateia e porque faz mal. E a barriga? Não sabes mas sou cheia de cicatrizes made with love de uma saúde que nunca gostou muito de mim - mas as piores são aquelas que não se veem e que me tornam em alguém que não suportas.

Sou má a confiar: tenho de confessar que vivo condicionada pelas ideias fundadas no passado e isso transforma-me em alguém doentio de quem eu própria não consigo gostar. Não tenho prazer nenhum ao duvidar e sofro muito mais com isso do que algum dia poderias imaginar - ainda me inferiorizo, ainda acho que perco para qualquer outra mulher porque todas elas são melhores do que eu pelo simples facto de serem normais. Em qualquer grupo de mulheres, sinto-me o gordo que é sempre o último a ser escolhido nas aulas de educação física. Imaginas o medo que tenho de perder sempre que me sou atacada pela vulnerabilidade do gostar?

No meio delas, quem é que me escolheria? Porquê eu? Fácil - porque sou eu. E não sou a última bolacha do pacote, não sou uma pepita de ouro, talvez nem sequer tenha nada de extraordinário, mas existo e vou até às últimas consequências de tudo aquilo em que me empenho. Sofro de um coração demasiado leal que faz as malas e jura a pés juntos que não volta mas, podes ter a certeza, se precisares de mim, eu acampo no jardim. Movo meio mundo se isso te fizer mais feliz - também sou má a desistir, sou má a ir embora. Sou má a arrumar os cacos e seguir em frente.

Gosto de ti e não tenho quaisquer dúvidas de que serias capaz de me fazer gostar muito mais, mas não soubeste lutar por mim. Dizeres-me que sou única é bonito mas não chega. Dizeres que tenho coisas que não encontras em mais ninguém é igualmente querido, mas também não é suficiente. Precisava que tivesses lutado por mim, que percebesses que as pessoas de quem gostamos não são feitas segundo os nossos critérios. As pessoas de quem gostamos são as pessoas de quem gostamos e ponto final. Com virtudes e defeitos, sem serem semi-deuses, sem serem super heróis.

Gostar de ti também implicou aceitar as coisas de que não gosto - a tua indecisão apoquenta a minha impulsividade. Não sou de rodeios porque, o que quero, quero para ontem - esperar semanas por uma resposta que me sinto capaz de dar em três segundos é desesperante. Mas queres saber? Até com isso eu aprendi a lidar, porque é isso que fazes com os defeitos de quem vale realmente a pena. E acredita que me vais fazer falta todos os dias, porque vai ser difícil encontrar alguém como tu - mas não posso fazer nada se não fazes questão de me manter ao teu lado. Queria que tivesses lutado por mim. Para te ser franca, ainda quero.

Há, de facto, erros imperdoáveis, há defeitos incontornáveis, pessoas insuportáveis. Permite-me a presunção: não creio que me insira em qualquer das categorias. Quer queiras quer não, valho mais do que isto. Sou bem mais do que os meus defeitos e esforcei-me mais por ti do que se irá esforçar a grande maioria das mulheres que cruzarão a tua vida a seguir, porque não terão paciência para esperar como eu esperei. Queres uma deusa perfeita, eu sou só eu, tenho um monte de defeitos mas, mesmo assim, não sou assim tão pouco quanto isso - vais acabar a procurar em outras o que encontraste em mim, mas com um feitio mais domável. Boa sorte com isso. Dei-te tempo, tentei que te decidisses - e, de entre todas as opções, escolheste deixar-me ir. Não é por ser a que vai embora que me dói menos; dói pra caralho. Mas, se me queres na tua vida, tens de aprender a demonstrá-lo. A prender. A agir. Tens de cometer meia dúzia de loucuras de vez em quando e provar que vale a pena ficar. Eu teria ficado se assim fosse - se calhar, ainda voltaria atrás, porque é isto que eu sou. Vivo para o que me faz acelerar o coração.

Talvez eu não seja o amor da tua vida... mas, ah, meu amigo, tu ainda vais lamentar ter-me perdido por uma estupidez.

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