Corre pela gare num ato desesperado; o comboio é só mais uma das coisas que ela perdeu. Senta-se no chão molhado, aperta as mangas demasiado compridas da camisola desbotada, crava as unhas na palma da mão. Com o nervosismo, nem dá pelo sangue a correr, nem dá pelas pequenas gotas vermelhas que agora mancham o cinzento do chão. Acende só mais um cigarro, morde só mais uma vez o lábio. O fumo desaparece-lhe à frente dos olhos, as pessoas não a veem, ou se a virem pensarão de certeza que ela é só mais uma dessas meninas da má vida que não interessam a ninguém. Ela nunca foi má, está só destroçada. Nada lhe faz sentido - só mais um cigarro, só mais um. Dizem os outros que é um vício, ela prefere chamar-lhe suicídio lento - quer essa morte dolorosa dos que se fartaram de viver mas não sabem se querem morrer. Ninguém olhou para ela, estava capaz de jurar que, foda-se, nem desconhecidos se perguntam se não precisará aquela miúda de uma mão para se levantar. Com a chuva, ninguém soube que ela chorou, ninguém sabe que ela continua a chorar. Há de acabar, com o tempo, por perceber que não lhe resta outra alternativa senão levantar-se e ir embora sozinha - ou saltar para a linha de uma vez. De outra forma nunca ninguém se importará.
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