Vinhas-me buscar.
Aqui, ali, a outro sítio qualquer - tanto me fazia. Nunca me assustou ter de fazer tantos quilómetros para te ver. Nunca me custou esforçar-me por ti - e custava-me ainda menos quando achava que valia a pena, que seria notada.
Vinhas-me buscar e eu sentava-me ao teu lado: o meu novo regresso a casa. Levavas-me a um sítio especial, a um sítio banal, a um sítio mais ou menos - ou a nenhum sítio, de todo. Levavas-me onde quisesses e, acredita, eu iria estar bem só por estar ao teu lado. Talvez te ouvisse cantar músicas tolas, talvez oscilássemos entre silêncios confortáveis e gargalhadas sobre vídeos parvos que viste no youtube. Não queria saber realmente disso.
Ter-te-ia levado os chocolates - os meus preferidos. Ter-te-ia levado os chocolates porque queria partilhá-los contigo num momento que tivesse tanto de curriqueiro quanto de extraordinário: talvez tenha um quê de romântica que escondo à força toda. Talvez seja ele que me mata. Quem sabe?
Imaginei-me feliz.
Imaginei que vestiria uma roupa bonita que me fizesse sentir mais cinderela e menos gata borralheira. Imaginei o prazer de estar ao teu lado sem os minutos contados, sem tempo a acelerar só para nos chatear, só para nos devolver a uma realidade onde não me é possível perder no teu abraço, onde o teu cheiro não se entranha na minha roupa e eu não me sinto tão calma, tão serena, tão bem - o mais próximo que tenho tido da felicidade.
Vinhas-me buscar, mas não vieste.
O teu tempo, tão escasso para mim, alarga-se em todas as outras direções certificando-se de que nunca me atinge. O teu tempo não me serve porque nada do que eu faça me torna suficientemente valiosa para que o gastes comigo: perdoo tudo, menos mentiras.
Foi como se um golpe no peito me tivesse deixado sem fôlego: nunca vou conseguir entender o que tenho de tão errado para que passem a vida a fazer-me mal - por mais complicada que eu seja, fui sempre o mais querida que conseguia, fiz sempre tudo para que visses impresso nos meus gestos o quanto significavas para mim, e o que ganhei em troca foi uma mentira.
Há diferenças entre um não quero e um não posso - a principal diferença estava em não me fazeres acreditar que havia um motivo válido para adiares algo que, para mim, era importante. Podia até ficar triste, mas poupavas-me à humilhação. Ao quanto me custa saber que me mentiste. Ao quanto me dói ter de assumir que, afinal, sou insignificante também para ti - só sirvo para quando não tens nada melhor para fazer.
[chegam sempre à minha vida a perguntar-me como que raio alguém fica tão inseguro a este ponto... e saem sempre da minha vida a dar-me motivos para ser ainda mais insegura.]
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