[fecho os olhos e caminhamos outra vez, lado a lado, à beira mar. está frio e entra mais areia nas minhas botas a cada passo dado, mas eu não me importo porque estás comigo.
no céu, pintado de um cinzento carregado como promessa de chuva, desenha-se um arco-íris a enfeitar aquela que será sempre a minha cidade; na tua companhia, parece-me ainda mais bonita. pensas tirar uma foto mas atrapalhas-te todo com o telemóvel; desistes. vou guardar esta imagem na memória, anuncias. espero que ainda a tenhas.
pelo canto do olho, observo cada um dos teus movimentos: sinto-me pequenina ao pé de ti e isso nada tem a ver com o facto de seres estupidamente mais alto. a forma desajeitada como caminhas sobre a areia faz-me sorrir - a tua confiança condimentada com uma dose de timidez torna-te absolutamente irresistível. soube-o nesse dia.
quando o céu cumpre com o prometido e as comportas se abrem, corremos para nos abrigar, sem abrigo possível. acabamos os dois, sentados, num banco de madeira com o vento a fustigar-nos nas costas: vês-me a tremer e aproveitas para me abraçar. é a primeira vez que o fazes e sabe-me tão bem que eu tolero o frio, a enregelar cada átomo do meu corpo, só para ficar mais um bocadinho no teu abraço quente. não te quero largar mais.
depois disso, sinto os teus lábios gelados pousados na minha testa. demoramos um tempo absurdo a percorrer o caminho de volta porque páras para me abraçar e para distribuir mais beijinhos entre a minha testa e as bochechas. sinto-me importante, depois de tanto tempo - e, com a cidade desenhada no horizonte a servir de plano de fundo, parece-me que nada poderia correr mal. és demasiado especial para que eu te deixe ir.
abro os olhos - é isto que acontece no fim: penso no início. penso em todas as sensações boas, que agora me vejo obrigada a arquivar, porque a minha tendência é destruir sempre tudo. penso em quanto eu gostava que me fosse possível voltar a moldar esta história e torná-la viável. dar-lhe um final feliz. mas um dia acordei e percebi que gostava demais, outra vez: pudesse eu recomeçar. pudesse eu voltar a este dia e fazer-nos possíveis.
pudesse eu, por uma vez, ser a escolhida da felicidade que parece estar sempre a esquecer-se de mim.]
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